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Josias de Souza

Para o STF, melhor alguém com o perfil do papa

Josias de Souza

25/01/2017 20h26

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Ives Gandra Martins Filho, presidente do Tribunal Superior do Trabalho, frequenta a lista de cotados para a vaga aberta no Supremo Tribunal Federal na condição de favorito. Vale a pena, portanto, dedicar meia dúzia de palavras ao personagem. Na área dos costumes, o pensamento do magistrado parou no século 19. Num artigo sobre 'Direito Constitucional', escrito em 2012, Ives Filho exibiu suas credenciais. A mulher deve ser submissa ao marido, ele acredita. A união entre homossexuais é tão antinatural quanto o casamento de uma mulher com seu cachorro ou de um homem com seu cavalo, ele ensina. Ives Filho é contra o divórcio, o aborto e as pesquisas com células-tronco.

O candidato à vaga de Teori Zavascki é religioso. Integra a ultraconservadora organização católica Opus Dei. No plano pessoal, sua filosofia de vida não interessa a ninguém. Numa poltrona do Supremo, o pensamento retrógrado do magistrado interessa ao país. Ives Filho critica decisões que a Suprema Corte já consagrou em julgamentos históricos, como o reconhecimento da união homoafetiva e a legalização das pesquisas com céulas-tronco.

Católico, o doutor tem toda a liberdade para professar sua religião. Mas numa poltrona do Supremo ele seria apenas um servidor público de um Estado laico. Nesse Estado, as mulheres não devem submissão aos homens. Nele, a união entre pessoas do mesmo sexo é um dado da realidade. Ao legalizar a união homoafetiva, o Supremo permitiu que esses brasileiros tivessem uma vida comum, partilhando desde planos de saúde até bens e imóveis.

Michel Temer diz que deseja indicar um ministro de perfil técnico. Talvez devesse procurar alguém com perfil do papa Francisco, que já declarou que a Igreja deve perdão aos homosexuais por tê-los marginalizado. "Se uma pessoa que tem essa condição tem boa vontade e procura por Deus, quem somos nós para julgar?", disse o papa.

– Atualização feita às 20h56 desta quarta-feira (25/1): Ives Gandra Filho divulgou nota sobre as notícias que trouxeram à luz laivos do seu pensamento. O doutor alega que foi tomado fora do contexto. Leia aqui notícia sobre a reação.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.