Trump erguerá um Muro de Berlim às avessas
Países ricos, como os Estados Unidos, sempre ergueram muros —físicos ou burocráticos— para impedir que refugiados da miséria, das guerras e dos variados tipos de fundamentalismo os invadissem além da conta. Donald Trump apenas troca a matéria-prima. Em vez de burocracia, usará concreto. Num mundo em que já não há pecados originais, Trump segue a mesma lógica dos construtores do muro de Berlim. Com uma diferença: os comunistas queriam separar dois modos de vida bloqueando a saída das pessoas, Trump quer impedir a entrada. Talvez seja desnecessário.
Houve um tempo em que muita gente ruminava a ilusão de que a felicidade universal seria alcançada quando o mundo se transformasse numa espécie de América hipertrofiada. Todos seriam americanos, com acesso à comida, aos prazeres e ao conforto que uma sociedade próspera é capaz de proporcionar. O sonho americano, que cambaleava há tempos, não incluía a companhia de Trump.
O populismo fascista de Trump é impulsionado pela ideia de que o trabalho não pode ter a mesma liberdade do capital. O capital do empresário Trump, como todos os outros, se muda livremente para onde ganha mais. Assim sucede também com as pessoas. Normalmente, quem pula o muro está atrás de um futuro que inclua emprego e segurança. E Trump: "Em primeiro lugar, os americanos. Em segundo lugar, os americanos. Por último, os americanos."
No mundo idealizado de Berlim Oriental, o regime comunista dizia não haver desemprego. Melhor: ali, todos tinham direito à felicidade vitalícia. O muro era necessário porque havia uma minoria ingrata que queria fugir levando todos os recursos que o Estado investira na sua formação. O muro caiu depois que as pessoas notaram que havia do outro lado, além de liberdade e do MacDonald's, supermercados sem racionamento e com 15 marcas diferentes de papel higiênico.
Na América projetada por Trump, convivem três flagelos: um antiglobalismo exacerbado, um nacionalismo à moda da década de 30 e um intervencionismo econômico de fazer inveja a Dilma Rousseff. Levados às últimas (in)consequências, esses três elementos produzirão resultados previsíveis: ou cai Donald Trump ou cai o número de pessoas interessadas em pular o muro. Não haverá Big Mac com fritas capaz de compensar a falta de oportunidades.
O mais irônico é que a chanceler alemã Angela Merkel tornou-se o principal contraponto à gestão xenófoba de Trump. No comando de um país sem o muro de concreto e permeável ao ingresso de refugiados, Merkel reagiu à eleição de Trump com rara sinceridade. Vale a pena recordar-lhe as palavras:
"Alemanha e Estados Unidos são unidos por valores —democracia, liberdade, respeito ao Estado de direito, dignidade das pessoas independentemente de sua origem, cor da sua pele, religião, gênero, orientação sexual e visões políticas. Com base nesses valores, me ofereço para trabalhar de perto com o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump."
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