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Josias de Souza

Chico Alencar se penitencia por ter confraternizado com os adversários

Josias de Souza

09/03/2017 19h40

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O deputado Chico alencar (PSOL-RJ) fez uma penitência diante de correligionários e eleitores no altar das Redes Sociais. Açoitado por ter confraternizado com adversários num jantar que reuniu o establishment político-jurídico-administrativo de Brasília, Chico ajoelhou no milho: "Errei, mas tropeço é para a gente levantar a poeira e dar volta por cima, prosseguir na caminhada."

O jantar do qual o deputado se arrependeu de ter participado ocorreu num restaurante chique de Brasília. Serviu para celebrar os 50 anos de jornalismo do bloqueiro Ricardo Noblat. Compareceram desde o presidente Michel Temer até Chico Alencar, que terminou a noite, já na madrugada de quarta-feira (8), numa mesa em que também recostava os cotovelos o senador Aécio Neves, presidente do PSDB.

Foi o diálogo com Aécio que mais rendeu críticas a Chico Alencar nas redes sociais. A reação dos seus correligionários oscilou entre a decepção e a indignação. "Houve, sim, uma conversa com Aécio, e jamais serei do partido de bem dele", disse o deputado do PSOL no seu vídeo-expiação. "Até porque a concepção de bem dele está mais voltada para bens e não para o bem comum. Tanto que defende a volta do financiamento empresarial, e isso pontuou a nossa conversa educada, mas profundamente discordante naquela noite."

Durante o jantar, Chico e Aécio haviam trocado um amistoso dedo de prosa sobre a Lava Jato e suas consequências. Abespinhado por ter sido levado às manchetes como protagonista de pedido de socorro monetário à Odebrecht que resultou em repasses no caixa dois para campanhas tucanas, Aécio dissera a Chico coisas assim: "Um cara que ganhou dinheiro na Petrobras não pode ser considerado a mesma coisa que aquele que ganhou cem pratas para se eleger."

A certa altura, Aécio pespegou uma indagação: "Haverá espaço para uma saída política ou vamos considerar que todo mundo é bandido e abrir espaço para um aventureiro salvador da pátria?" O grão-tucano insinuou que os políticos precisam costurar uma saída: "A solução é na política", declarou, antes de lançar na atmosfera mais uma interrogação: "Tudo que foi construído para salvar a política vamos deixar que se perca numa briga insana, botando todo mundo junto no mesmo barco?"

Entre risos, Aécio sugeriu: "Vamos fazer um partido, eu e você? O partido do bem. […] Nós não podemos nos matar mutuamente, a saída não vai ser por aí." E Chico: "Nem nos proteger. Sem sentar e conversar não tem solução. Enquanto isso, a população está achando que somos o cocô do cavalo do bandido. Temos que fazer um novo pacto nacional." Ao final da conversa, Chico e Aécio se abraçaram. Por mal dos pecados, o deputado do PSOL beijou a mão do interlocutor. E soltou um despretensioso "você é do bem." Com isso, ateou fogo à sua lista de seguidores na internet.

No vídeo da penitência, Chico afirmou que não deveria ter comparecido ao jantar. Mas conhece Noblat e não conhecia a lista de convidados. "Em segundo lugar, tendo ido, poderia ter me limitado a dar um abraço nele, pelo seu meio século de jornalismo e ir embora. Terceiro, percebendo que […] acabou sendo uma espécie de reunião da corte de Brasília, eu deveria não ter me dado a certas ironias, a certas descontrações, que são muito da minha personalidade, a certas amenidades, que ali não caberiam, porque, com muita probabilidade, seriam mal interpretadas e levadas para a ideia que estou convivendo com os meus adversários. Portanto, errei…"

Chico agradeceu as críticas e afirmou que o jantar não vai apagar sua história de vida e a do PSOL. Uma "história de luta e combate justamente contra os podres poderes, contra o conluio, aí a portas fechadas, na calada da noite, dos partidos. E todos os grandes partidos estão nessa, querem se salvar do tsunami das denúncias das empreiteiras. Não houve, evidentemente, nenhum pacto…"

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.