Topo

Josias de Souza

Recandidatura de Janot irrita grupo de procuradores e anima os investigados

Josias de Souza

13/03/2017 03h14

O desejo do procurador-geral Rodrigo Janot de se recandidatar ao cargo fez dele um alvo de críticas e maledicências. Em privado, procuradores contrários à ideia de conceder um terceiro mandato de dois anos a Janot o acusam de colocar a Lava Jato a serviço de sua vaidade. No Senado, investigados que têm poderes constitucionais para rejeitar a recondução de Janot enxergam na movimentação do personagem uma oportunidade a ser aproveitada.

Embora não admita em público, Janot se prepara para disputar a cabeça da lista tríplice de candidatos à chefia do Ministério Público Federal. A relação irá à mesa de Michel Temer, a quem caberá escolher um nome para submeter à apreciação do Senado em setembro, quando termina o segundo mandato de Janot. A antecipação do debate eletrifica os porões da Procuradoria num instante em que a Lava Jato muda de patamar com a deflagração dos inquéritos decorrentes das delações da Odebrecht.

Os procuradores vivem algo muito parecido com um racha. O pedaço da corporação que se opõe à continuidade de Janot alega que o grupo do procurador-geral escora sua recandidatura num falso argumento. Nessa versão, os partidários de Janot sustentariam a tese de que a permanência dele é indispensável à condução dos processos da Lava Jato. Seus opositores enxergam nessa pregação um quê de onipotência e de presunção.

"A tese flerta com a onipotência porque pressupõe a inexistência na Procuradoria de pessoas capazes de substituir um procurador-geral dotado de poderes absolutos", disse ao blog um dos colegas que olham para Janot de esguelha. "A tese embute uma certa presunção porque a lentidão da Lava Jato em Brasília é uma evidência de que todos estão sujeitos à condição humana. Há muito por ser aprimorado na coordenação dessa investigação. E o Janot deveria estar concentrado nisso."

Mantido o desejo continuísta, Janot terá de contar com a boa vontade de políticos encrencados. Se for indicado pelo delatado Michel Temer, precisará passar novamente pelo crivo de um Senado apinhado de investigados. Que podem rejeitar sua recondução ou cozinhá-la em banho-maria, para obter algum tipo de concessão. Um movimento como esse levaria às fronteiras do paroxismo o esforço da turma que gostaria de "estancar a sangria.".

A oligarquia política já mostrou do que é capaz ao acomodar dez investigados da Lava Jato na Comissão de Constituição e Justiça do Senado, responsável pela sabatina de candidatos a procurador-geral. O rol de encrencados inclui o senador Edison Lobão (PMDB-MA), que foi escolhido por seus pares para presidir o colegiado. Janot dependerá do voto dessa gente, que saboreia desde logo a ilusão de ter o xerife da Lava Jato na mão.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.