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Josias de Souza

PT e PSDB amavam Odebrecht enquanto fanáticos se odiavam em praças públicas

Josias de Souza

15/04/2017 18h38

PT e PSDB monopolizam as eleições presidenciais no Brasil há mais de duas décadas. Com o passar do tempo, as disputas foram adquirindo um quê de briga de pátio de colégio. Na sucessão de 2014, a coisa descambou. O tucanato dizia que o petismo roubara no mensalão e no petrolão. E o petismo respondia que o tucanato é que assaltara no mensalão mineiro e no escândalo dos trens paulistas. De repente, os delatores da Odebrecht esclarecem que os dois lados têm razão. E os torcedores fanáticos, que pareciam dispostos a matar e morrer por uma honra inexistente, percebem que fizeram papel de bobos. Não sabem onde enfiar o ódio que estocaram para alimentar suas lacraias interiores.

Há dois anos e meio, quando Dilma foi reeleita, Aécio era o principal líder da oposição e Lula se jactava de ter dado à luz um poste pela segunda vez —algo nunca antes visto na história do país. Hoje, Dilma é matéria-prima para Sergio Moro, Aécio divide com o notório Jucá o título de campeão de inquéritos da lista de Fachin e Lula nunca esteve tão próximo da cadeia. Legenda de um líder só, o PT está no brejo sem cachorro. Com Alckmin e Serra no mesmo pântano, o PSDB ficou num mato com João Doria. O tucanato, incorporado ao governo de Michel Temer, virou força auxiliar de um apodrecido PMDB. O PT, devolvido à oposição, derrete como sorvete exposto ao sol.

A lição primeira da hecatombe produzida pela colaboração da Odebrecht deveria ser a de que todas as premissas sobre as quais o eleitor brasileiro construiu as suas ilusões políticas depois da redemocratização do país precisam no mínimo pegar um pouco de ar. Para que o desastre servisse de aprendizado, seria preciso que os brasileiros se convencessem de que a industrialização do ódio pior do que uma sandice, é um erro. A maluquice se apaga com o esquecimento. O erro exige reflexão e correção.

Enquanto os fanáticos se odiavam em praça pública —ou nas redes sociais, que muitos acreditam ser a mesma coisa— petistas e tucanos amavam a Odebrecht no escurinho do departamento de propina da empreiteira. Parte da torcida ainda tenta fechar os olhos para a realidade. Mas está cada vez mais difícil. Os 78 delatores da Odebrecht azucrinam os fanáticos em toda parte. Eles estão na tevê, no rádio, na internet, no jornal, na revista…. E não adianta ignorar o noticiário. A voz de Marcelo Odebrecht pode invadir o grupo da família no aplicativo do celular, exigindo uma reação do fanático. Pode ser uma cara de nojo.

Há também a opção de continuar enxergando a democracia como o regime em que as pessoas têm ampla e irrestrita liberdade para exercitar a sua capacidade de fazer besteiras por conta própria, tratando a eleição como uma loteria sem prêmio e encarando o voto como um equívoco que pode ser renovado de quatro em quatro anos. De resto, aqueles que preferem odiar alguém a amar o país, podem odiar-se a si próprios. Como diria Nelson Rodrigues, um dia o sujeito acaba arrancando a própria carótida e chupando o próprio sangue, como um vampiro de si mesmo.

– Ilustração via Amorim Cartoons.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.