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Josias de Souza

Duque aproximou Lula do status de condenado

Josias de Souza

05/05/2017 18h43


O depoimento espontâneo de Renato Duque a Sergio Moro alterou drasticamente a situação penal de Lula. Até aqui, o grão-mestre do PT era personagem de uma ficção em que imóveis reformados lhe caíam sobre o colo —um sítio em Atibaia, um tríplex no Guarujá. Duque injetou na fantasia de Lula uma realidade que tem começo, meio e fim. Nela, Lula desempenha um papel mais condizente com o seu histórico -o papel de chefe.

Duque pintou no depoimento um Lula muito parecido com o personagem retratado numa petição que o procurador-geral da República Rodrigo Janot protocolou no Supremo Tribunal Federal em maio do ano passado. Na peça, Janot requereu a inclusão do ex-presidente petista no "quadrilhão", como é conhecido o principal inquérito da Lava Jato.

Janot anotou: "Essa organização criminosa jamais poderia ter funcionado por tantos anos e de uma forma tão ampla e agressiva no âmbito do governo federal sem que o ex-presidente Lula dela participasse."

Representante do PT na diretoria corrupta da Petrobras, Duque adicionou carne no angu do procurador-geral. Disse que Lula não apenas sabia da roubalheira como era beneficiário das propinas. Contou detalhes dos encontros secretos que manteve com o pajé do petismo. Revelou mais: com a Lava Jato nos seus cancanhares de vidro, Lula orientou Duque a apagar as digitais que imprimira em contas na Suíça. Não é só: segundo Duque, Lula ecoava preocupações de Dilma Rousseff.

O depoimento de Duque mostrou que a defesa de Lula se autoimpôs uma missão irrealizável. Para refutar a acusação de que seu cliente era o comandante máximo do petrolão, os advogados de Lula se esforçam para provar que aquele ex-operário que chegou à Presidência como um mito e deixou o Planalto como um recordista de popularidade era, na verdade, um míope meio bobo —indigno de sua trajetória de sucesso.

A cinco dias do encontro de Lula com Sérgio Moro, o enredo do maior escândalo da história tornou-se mais lógico. Diferentemente do que sucedeu com o mensalão, o petrolão se afasta da construção fictícia de uma corrupção acéfala, uma máfia sem capo. O depoimento de Renato Duque alterou o status de Lula. O chefão do PT se distancia da condição de bobo, aproximando-se da de condenado.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.