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Josias de Souza

Brasil gosta tanto de piada que o TSE virou uma

Josias de Souza

27/05/2017 03h43

A relação incestuosa de Michel Temer com um pedaço do plenário do Tribunal Superior Eleitoral transformou a apreciação das contas da campanha vitoriosa em 2014 numa casa da Mãe Joana. A pretexto de contribuir para a salvação do PIB, a veneranda senhora vinha usando as provas que incriminam a chapa Dilma—Temer como gordura na fritura do próprio TSE. Subitamente, a conjuntura virou. E a Corte Eleitoral promote para o dia 6 de junho um espetáculo inédito: vai desfritar um ovo.

As páginas do processo expõem uma inacreditável realidade. Nela, um mar de dinheiro roubado da Petrobras escorreu para o caixa do comitê eleitoral de Dilma. Mas quando o processo ganhou corpo uma outra realidade se apresentou, mais inacreditável do que a anterior. Magistrados tarimbados, de aparência respeitável, aceitaram a tese de que a lama era de responsabilidade de Dilma. E Temer não tinha nada a explicar. Como Dilma já fora deposta, o assunto estava encerrado.

A lama escorreu pelos escaninhos do TSE por um ano. Algumas togas conviveram com as provas fingindo que elas não se avolumavam no processo e no site do tribunal. Os julgadores pisavam nas evidências distraídos quando a delação da JBS transformou Temer num morto-vivo investigado no Supremo Tribunal Federal por corrupção, obstrução da Justiça e formação de organização criminosa.

Nada a ver com crimes eleitorais demonstrados nos autos do TSE. Mas o governo que prometia recolocar a economia nos trilhos descarrilou. E tudo o que o TSE fingia que não aconteceu passou a merecer explicação. Temer ainda não sabe o que dizer. Mas já esboçou uma rota de fuga. Sonha com um pedido de vista que adie o julgamento indefinidamente. Se um dos sete ministros do TSE se prestar a desempenhar esse papel não restará dúvida: o Brasil gosta tanto de piadas que o Tribunal Superior Eleitoral se transformou em uma.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.