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Josias de Souza

Temer: 'Duvido que o Loures vá me denunciar'

Josias de Souza

02/06/2017 14h28

Michel Temer disse duvidar que o ex-assessor Rodrigo Rocha Loures, filmado recebendo mala com R$ 500 mil em propina da JBS, se anime a denunciá-lo num acordo de delação premiada. Mas não chegou a descartar completamente a possibilidade. Em entrevista à revista Isto É, o presidente declarou:

"Acho que ele é uma pessoa decente. Eu duvido que ele faça uma delação. E duvido que ele vá me denunciar. Primeiro, porque não seria verdade. Segundo, conhecendo-o, acho difícil que ele faça isso. Agora, nunca posso prever o que pode acontecer se eventualmente ele tiver um problema maior, e se as pessoas disserem para ele, como chegaram para o outro menino, o grampeador [Joesley Batista]: 'Olha, você terá vantagens tais e tais se você disser isso e aquilo'. Aí não posso garantir."

Perguntou-se a Temer se esperava ver o ex-assessor, que teve o pedido de prisão renovado pelo procurador-geral da República Rodrigo Janot, andando com uma mala contendo R$ 500 mil em dinheiro vivo. E Temer: "Confesso que não. É até surpreendente. Não sei a que atribuir isso, se atribuo à ingenuidade suprema, porque o sujeito pegou uma mala numa pizzaria." Sentiu-se traído? "Não me senti traído porque não tenho nada a ver com isso." Tem ligação com o PMDB? "Não creio." Seria, então, uma atitude isolada? "Isolada", disse Temer, concordando com o repórter.

Pela primeira vez, Temer admitiu a hipótese de trocar o comando da Polícia Federal: "Pode ser que o novo ministro [da Justiça, Torquato Jardim] levante os dados todos que ele julgue convenientes e venha conversar comigo sobre isso. Fui secretário da Segurança Pública em São Paulo, duas vezes, e eu tinha que ter pessoas da minha confiança em certos cargos, então eu mudava delegado-geral, mudava o comando da Polícia Militar quando necessário. A mudança do diretor da PF vai depender do novo ministro".

O presidente disse não recear que a eventual substituição de Leandro Daiello, diretor-geral da Polícia Federal, gere interpretações malévolas: "Só seria mal interpretada se você dissesse assim: só existe uma pessoa na Polícia Federal capaz de comandá-la. Mas isso desmerece a instituição e tenho certeza que o próprio diretor não pensa dessa maneira."

A exemplo do que sucede com Lula, Dilma e todo o petismo, Temer também passou a estimular a versão de que pode estar sendo vítima de um complô: "Olha, fica difícil dizer, mas não fica difícil supor. É interessante como há uma conjunção de urdidura. Houve um esquema preparado para chegar a isso e de que maneira? Do tipo: traga alguém graúdo para poder valer a delação. Então o sujeito sai de gravadorzinho na mão procurando quem é que ele vai gravar e depois há todo um processo. Você veja: há um inquérito, que não se quer inquirir, em que se quer fazer a denúncia independentemente do inquérito, com prazos muito exíguos, como 24 horas para apresentar os quesitos para a perícia, isso num sábado a partir das 20h para vigorar até o domingo, às 20h, fora do expediente forense. Então eu olho isso e tenho o direito de supor que seja uma tentativa de derrubar governo."

Curiosamente, Temer ainda fala sobre sua conversa com o delator Joesley Batista, recebido no Palácio do Jaburu na calada da noite, como se o mundo estivesse fazendo tempestade em copo d'água: "Não achei que seria uma gravidade tão imensa [o diálogo com o dono da JBS]. Já ouvi tanta coisa na vida. Várias pessoas vêm me falar coisas. E meu estilo não é agressivo. Olha, você está preso. Isso eu não faço. Eu vou examinar. Se eu conhecer a personalidade do indivíduo que está me falando as coisas, tomarei providências de acordo com o conhecimento que eu tenho da sua personalidade. Farei dessa maneira."

Receberia Eduardo Cunha? "Não sei, mas acho que não teria dificuldade se for procurado", respondeu Temer. "Eu converso com tanta gente. Mas aí vão dizer que o presidente não pode conversar com certas pessoas. Isso não existe. Eu fui vítima do meu jeito de ser no tocante a receber as pessoas. Hoje eu começo a achar que, por exemplo, foi uma falha ter recebido o procurador-geral duas ou três vezes no Jaburu sem agenda. Como ter recebido inúmeros jornalistas e empresários fora da agenda. Foi uma falta de liturgia que, até digo, é inadmissível no cargo."

Instado a comparar a crise que engolfa o seu governo com a conjuntura que desaguou na deposição de Dilma Rousseff, Temer declarou: "No impeachment da ex-presidente havia milhões de pessoas nas ruas. Esse é um ponto importante, não é? Segundo ponto: não havia mais apoio do Congresso Nacional. No meu caso, não. O Congresso está comigo. A oposição que se faz não é quanto ao conteúdo das reformas, mas uma oposição política. A situação é completamente diferente."

Temer evitou comentar a hipótese de o PSDB desembarcar do governo. "Vou esperar perder o apoio primeiro, né, para depois examinar. Não estou perdendo o apoio. O que eu vejo é muito achismo. E achismo no sentido de que o governo paralisou, o país não vai para frente. Meu Deus do céu, na semana seguinte, a Reforma Trabalhista foi lida, com todos aqueles acidentes, no Senado Federal".

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.