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Josias de Souza

Temer se diz culpado por associação: correligionários delinquiram, não ele

Josias de Souza

21/09/2017 05h55

Rodeado por correligionários denunciados —Moreira Franco e Eliseu Padilha— ou presos —Geddel Vieira Lima, Eduardo Cunha, Henrique Eduardo Alves e Rodrigo Rocha Loures— Michel Temer afirma estar levando a culpa por mera associação. Sem citar nomes, declarou:

"O que aconteceu comigo foi exatamente isso. Você é presidente da República, da Câmara, vice-presidente, presidente de um partido, você encontra pessoas que tiram fotos com você, recebe bilhetes, pessoas convivem com você, e aí praticam um ilícito qualquer, aí você também é delituoso. Isso está acontecendo com muita frequência no Brasil."

As declarações de Temer foram feitas numa entrevista à Reuters, em Nova York, antes de voar de volta pra o Brasil. Tomado pelas palavras, o presidente parecia sentir-se como uma espécie de navio que abandona os ratos. Além de jogar os amigos ao mar, sustentou que a apuração dos crimes deve ser levada às últimas consequências: "Eu acho que devem ser apurados e apurados até o seu final. Verificar quem são realmente os praticantes de ilícitos e quem não são."

Numa evidência de que o cinismo vai se tornando uma forma de patriotismo, Temer esqueceu o papel de coveiro de denúncias que desempenha na Câmara para declarar o seguinte: "Eu acho que a Justiça tem que continuar funcionamento no Brasil, como funciona, se não tira a credibilidade."

Posicionou-se contra a ideia de anistiar criminosos: "Se a gente disser agora 'nós vamos fazer uma anistia plena, geral e irrestrita para todos aqueles que eventualmente cometerem ilícitos', isso tira a credibilidade institucional."

Denunciado um par de vezes pela Procuradoria-Geral da República, Temer reduziu seus problemas a uma perseguição de seus rivais: "O que está acontecendo é isso: uma oposição radical. Ela leva às últimas consequências. Mas volto a dizer: essas coisas têm que ser apuradas e eu não me preocupo minimamente com isso."

De volta a Brasília, Temer desperdiçará o grosso do seu tempo preocupando-se com a organização do funeral da nova denúncia que o Supremo Tribunal Federal decidiu enviar à Câmara. A exemplo do que fez com a acusação de corrupção passiva, o presidente deseja enterrar também os indícios de que pode ter formado uma organização criminosa. Fará qualquer coisa para impedir a apuração de fatos que seu gogó apreciaria ver investigados.

"As instituições estão funcionando regularmente. O Judiciário funciona regulamente, o Legislativo, o Ministério Público. Tanto que quando há essas afirmações elas são apuradas", declarou.

Temer acrescentou: "Até no meu caso você sabe que há manifestações. Mas essa matéria está toda no Judiciário. Claro que eu digo aqui que são inverdades absolutas, com um certo desejo de que o Brasil está nessa ou aquela posição na corrupção. Mas o fato é que a corrupção está sendo combatida."

Então, tá!

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.