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Josias de Souza

Votação da Previdência em 2017 é improvável

Josias de Souza

07/12/2017 19h54

Até os ácaros do tapete do salão verde da Câmara já sabem que o Planalto não dispõe de votos para aprovar a reforma da Previdência, mesmo na versão atual, lipoaspirada. Nos últimos dias, vende-se a ideia de que o governo coleciona adesões que o aproximariam dos 308 votos necessários. Nessa versão, já haveria no cesto da reforma algo como 260 ou 270 votos. É lorota. Se fosse votada hoje, a emenda constitucional sobre a Previdência arrastaria pouco mais de cem votos. Deve-se a contabilidade do governo a uma matemática criativa.

Há na Câmara, 513 deputados. Excluindo-se os oposicionistas, refratários à reforma, os deputados que se dispõem a aprovar a emenda constitucional em qualquer circunstância somam pouco mais de uma centena. O resto, embora não seja avesso à reforma, prefere adiar a votação. Para não ficar mal com o Planalto, alguns deputados que integram a banda pró-adiamento dizem que considerariam a hipótese de votar a favor se houvesse a certeza de aprovação. E o governo contabiliza essa gente na coluna dos votos indubitáveis. Daí a conta que chega à marca fantasiosa de até 270 votos.

Brinca-se de esconde-esconde em Brasília. De dentro do armário, os governistas declaram-se a favor da reforma porque suspeitam que Michel Temer não conseguirá levar 308 votos à vitrine. Não haveria, portanto, razões para se expor. O Planalto, por sua vez, finge que coleciona votos sem dar nome aos votantes. Dono da pauta de votações, o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara, diverte a plateia —ora diz estar pessimista, ora declara ter acordado realista. Enquanto isso, esquiva-se de marcar o dia de uma votação que sabe ser improvável.

Para saltar do papel, a versão mequetrefe de reforma da Previdência proposta pelo governo teria de atravessar dois turnos de votação na Câmara e dois turnos no Senado. Foi para as cucuias a hipótese de realizar duas votações na Câmara antes do recesso parlamentar do final de ano. Está prestes a ir para o beleléu a chance de os deputados aprovarem a matéria pelo menos em primeiro turno.

Hoje, o mais provável é que tudo seja transferido para 2018. O que dificultará ainda mais a aprovação. Os deputados já começam a ajustar o discurso. Até aqui, diziam que não queriam correr o risco de cutucar o eleitor com o pé para ver se ele morde. Agora, alguns começam a sustentar a tese segundo a qual a reforma da Previdência é tão importante que precisa ser debatida na campanha presidencial, para ser encaminhada por um presidente que tenha passado pela pia batismal das urnas.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.