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Josias de Souza

PT lança uma campanha contra a prisão de Lula

Josias de Souza

11/03/2018 17h39

Aos pouquinhos, o PT vai deixando em segundo plano a candidatura presidencial de Lula. Neste domingo, a presidente da legenda, Gleisi Hoffmann, convocou petistas e simpatizantes para se engajar em outra causa: uma campanha contra a prisão de Lula, que deixou de ser mera hipótese depois que o Superior Tribunal de Justiça negou o habeas corpus preventivo pedido pela defesa do condenado petista.

"A prisão de Lula é um dos maiores retrocessos à sociedade brasileira, à nossa democracia e às conquistas de direito", disse Gleisi em vídeo divulgado nas redes sociais. "A partir dessa semana o PT começa essa campanha. Não só por redes, pela internet, com material de esclarecimento, mas também com material impresso."

Gleisi sugere aos devotos de Lula que peguem no site do PT panfletos como este que vai reproduzido abaixo. Ela orienta: "…Distribua no seu local de trabalho, onde você estuda, na rua, onde você mora. Fale com a população. Diga o que está acontecendo. Chame essa atenção."

A presidente do PT prosseguiu: "A prisão de Lula vai ser muito perversa ao povo brasileiro. Nós temos que deixar bem claro: nós não vamos assistir mansamente à prisão do nosso líder, aliás, o líder do povo. […] Nós vamos com Lula até o final. Nós vamos com Lula até as últimas consequências."

A inquietação do petismo cresce porque o TRF-4 deve concluir até o final do mês o julgamento do último recurso protocolado pela defesa de Lula na segunda instância. Chama-se "embargo declaratório". Não altera a condenação. Serve, no máximo, para esclarecer eventuais dubiedades ou omissões da sentença. Vencida essa etapa, o tribunal liberará o juiz Sergio Moro para expedir o mandado de prisão de Lula, condenado a 12 anos e 1 mês de cadeia.

A essa altura, apenas uma decisão do Supremo Tribunal Federal poderia livrar Lula do encarceramento. Contudo, a presidente da Corte, Cármen Lúcia, reagiu à pressão exercida sobre ela impondo um novo revés ao candidato à cadeia. Ela antecipou a divulgação da pauta de julgamentos que a Suprema Corte realizará no mês de abril. E excluiu da lista duas ações que tratam genericamente da prisão de condenados em segunda instância, além do habeas corpus ajuizado pela defesa de Lula.

Em teoria, qualquer ministro do Supremo pode levar processos diretamente ao plenário, sem passar pelo crivo da presidência. Imaginou-se que Edson Fachin, relator do habeas corpus de Lula, faria isso. Mas ele decidiu submeter-se ao calendário de Cármen Lúcia. Na semana passada, o PT animou-se com a possibilidade de Ricardo Lewandowski levar ao plenário um par de habeas corpus cujo julgamento beneficiaria Lula por tabela. Mas o ministro tampouco se animou a furar a fila da presidente.

A sequência de más notícias fez cair a ficha do PT, forçando o partido a mudar de assunto. Em vez de sucessão, só se fala em prisão. "Vivemos tempos sombrios no Brasil", declarou Gleisi em seu vídeo. "Não temos normalidade democacrática, política e institucional. É nesse processo que a perseguição de Lula acontece. O PT defende que o Supremo Tribunal Federal coloque em pauta novamente a discussão sobre o cumprimento da pena após julgamento em segunda instância."

Para Gleisi, "é um absurdo quererem prender o maior líder popular que este país já teve. Nós não podemos assistir isso como se fosse normal em nosso país. Não é normal."

A senadora petista não explica o que é "normal" na sua concepção. Considerando-se que a própria Gleisi é ré em ação penal da Lava Jato, levando-se em conta que a bancada mensaleira que passou pela cadeia da Papuda continua nos quadros do PT, a corrupção é, para a cúpula da legenda, uma mera anormalidade proposital do partido para denunciar a normalidade de um sistema político baseado na hipocrisia.

Ao lançar a campanha contra a prisão de Lula, o PT busca atingir uma proeza: a legenda tenta dissociar-se de suas ações espúrias, mantendo-se incólume a si mesma. Alheia a três decisões já tomadas pelo Supremo sobre prisão de condenados em segunda instância, Gleisi ensina: "Ninguém pode se preso senão por trânsito em julgado de sentença condenatória. E trânsito em julgado é quando o último tribunal dá o seu veredicto sobre o processo. E o último tribunal é o Supremo Tribunal Federal."

A senadora não percebeu. Mas sua pregação não beneficia apenas Lula. Por tabela, Gleisi e a campanha petista se insurgem contra a prisão de todos os corruptos sentenciados no escândalo da Petrobras e seus congêneres. O lema da nova campanha do PT é: "O povo quer Lula livre". Mas pode ser traduzido para: "O povo quer Eduardo Cunha livre." Ou: "O Povo quer todos os larápios com sentenças confirmadas na segunda instância livres da cana dura." Ou ainda: "Prisão de corrupto é um atentado à democracia."

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.