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Josias de Souza

FHC rumina dúvidas sobre Bolsonaro! E o PSDB?

Josias de Souza

18/12/2018 05h09

Numa palestra que ministrou em São Paulo, Fernando Henrique Cardoso despejou sobre a audiência suas dúvidas em relação ao futuro governo de Jair Bolsonaro. E foi incapaz de expressar uma certeza qualquer sobre o seu partido, o PSDB.

"Minha expectativa é que o governo, que não existe ainda, vai terminar um ciclo, vai matar um ciclo" inaugurado com a Constituição de 1988, declarou FHC. "Esse ciclo já estava morrendo."

Impossível discordar de FHC. Pode-se, no máximo acrescentar um detalhe: a morte do ciclo pós-redemocratização começou antes, muito antes da ascensão de Bolsonaro. E o PSDB revelou-se um vivo pouco militante.

Mais recentemente, a inatividade do tucanato roçou as fronteiras do paroxismo. Foi tão vigorosa que o eleitor sentiu-se à vontade para enviar coroas e atirar na candidatura presidencial de Geraldo Alckmin a pá de cal de um quarto lugar.

FHC disse não saber se Bolsonaro "vai ser capaz de criar outro" ciclo. Soou como um São Tomé invertido, do tipo que quer ver para não crer. "Eu tenho uma interrogação. Não estou dizendo que não vai ser capaz. Estou dizendo que eu não sei se vai ser capaz de criar outro, imaginar formas políticas."

O grão-mestre do tucanato faria melhor se cuidasse das interrogações que rondam a sua legenda. Antes de olhar para o lado, poderia responder: o que o PSDB tem a oferecer? O que foi mesmo que Alckmin propôs? Enquanto não espantar esse tipo de questão, a dúvida sobre Bolsonaro será sempre um desabafo, não uma solução.

O "germe da inquietação" está ativo em várias partes do mundo, disse FHC. Como exemplo, citou a revolta dos coletes amarelos na França. "É um momento novo no mundo, não é só aqui, não."

De fato, a inquietação está em toda parte, exceto no PSDB. No ninho tucano, abundam inação e pasmaceira. A legenda teve a oportunidade de reagir quando a biografia do filiado Eduardo Azeredo enferrujou. Nada.

A ferrugem avançou sobre as reputações de José Serra e de Aécio Neves. Nem sinal de reação. Até a biografia de Alckmin foi oxidada por um enredo de caíxa dois. E nada.

Num cenário assim, é natural que FHC se preocupe mais com a interrogação que flutua sobre o futuro do novo governo. Deve lhe doer a ideia de que faz o papel de um ex-monarca longínquo, numa peça confusa, em que o protagonista é o João Doria e cujo epílogo é a adesão do ex-PSDB ao governo Bolsonaro.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.