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Josias de Souza

Brumadinho expõe refinamento da incompetência

Josias de Souza

28/01/2019 19h48

Na tragédia de Brumadinho, o brasileiro observa da pior maneira possível o refinamento, o cuidado, o extremo acabamento e o custo com que, no Brasil, se exerce a incompetência. No momento, os administradores do desastre se esforçam para atenuar o desespero da plateia. Junto com o mar de lama, encosta no noticiário uma onda de remorso coletivo.

A mineradora Vale promete que suas barragens terão um "colchão de segurança" jamais visto. Autoridades de Minas Gerais e de Brasília acenam com leis mais rigorosas e fiscalizações implacáveis. Tudo isso deveria ter sido feito depois do estouro da barragem de Mariana, há três anos e dois meses. Mas os gestores do descalabro anterior cuidaram de fazer o pior da melhor maneira possível.

Numa auditoria de 2016, o Tribunal de Contas da União concluiu que Mariana foi o resultado de uma incapacidade crônica no setor de fiscalização do Departamento Nacional de Produção Mineral, o DNPM. O TCU alertou para "o risco latente e potencial de novos acidentes envolvendo barragens de rejeitos de mineração." O que fez o governo? Rebatizou o DNPM. Hoje, na esfera federal, a incompetência tem outro nome: Agência Nacional de Mineração.

Mudaram também os protagonistas da crise. A Vale tem nova direção. Há governantes recém-eleitos em Minas e Brasília. Todos falam sobre o inaceitável com uma ponta de remorso alheio. Prometem por pressão o que os antecessores deixaram de fazer por opção. O conta-gotas macabro da tragédia de Brumadinho informa que o remorso chega quando já não adianta mais para uma legião de mortos. A incompetência, quando exercida de forma tão competente, mata.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.