Congresso renovado estreia com cara de velho
O Congresso que se instala nesta sexta-feira é o mais renovado das últimas três décadas. Dois deputados novatos encontraram-se pela primeira vez no Salão Verde, defronte da entrada do plenário, na véspera da sessão inaugural. O repórter entrevistava um deles quando o outro se aproximou. Para puxar assunto, disse estar surpreso com o noticiário sobre o favoritismo de Rodrigo Maia e Renan Calheiros na disputa pelas presidências da Câmara e do Senado. E o outro: "Maia e Renan… Irrrrc! Fora isso, o que você está achando do Congresso?"
Por alguns segundos, os calouros fizeram cara de velório. Desautorizaram a citação dos seus nomes. "Não convém chegar se indispondo com quem dá as cartas", explicou o autor do "Irrrrc!". Parecia se dar conta de que, suprimindo-se os detalhes que conspurcam o entusiasmo, pode-se enxergar um lado positivo em tudo. Na renovação do Parlamento, por exemplo. Fora a presença de dois investigados da Lava Jato no topo das apostas para o comando das duas Casas legislativas, a companhia de sobreviventes como Aécio Neves na Câmara e Jader Barbalho no Senado e a estreia de pseudonovidades, as urnas deram uma boa resposta à podridão da política.
Dos 513 deputados eleitos, 244 sentarão nas poltronas do plenário da Câmara pela primeira vez. Um índice de renovação de 48%. Ocorre que mais da metade desse percentual é composto de gente que já atuava na política —ex-senadores, ex-governadores, ex-prefeitos, ex-deputados estaduais, ex-secretários de Estado… No Senado, estavam em jogo nas eleições do ano passado 54 das 81 cadeiras. Elegeram-se 46 novatos. Taxa de renovação de 85%. Mas ali também um pedaço do "novo" carrega o prefixo "ex". Uma massa de ex-qualquer coisa, muito parecida com pão dormido.
Diante da urna, o eleitor arrancou o nariz vermelho, jogou longe o colarinho folgado, livrou-se dos sapatos grandes e riscou o fósforo. Tocou fogo no circo. Decorridos quatro meses, vai começar o rescaldo. Pelo timbre dos discursos e pelo teor dos votos, logo ficará claro de que matéria-prima é feita a turma que o eleitor colocou no lugar dos escorraçados.
Flávio Bolsonaro, o filho mais velho do presidente, chega ao Senado deixando atrás de si o rastro pegajoso da movimentação bancária suspeita e das homenagens a milicianos, o desemprego ainda é exorbitante, o Planalto demora a expor sua proposta de reforma da Previdência, a lama de Brumadinho matou mais do que a de Mariana, o crime organizado toca o terror no Ceará. Mas fora isso…
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