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Josias de Souza

Lama e caixões tornam defesa da Vale ofensiva

Josias de Souza

14/02/2019 22h16

O presidente da Vale , Fábio Schvartsman, estreou num palco legislativo. Tentou explicar-se numa audiência realizada na Câmara. Fez declarações típicas de um executivo empenhado na defesa de sua empresa. Coisas assim: "A Vale é uma das melhores empresas que eu conheci da minha vida. É uma joia brasileira, que não pode ser condenada por um acidente que aconteceu em sua barragem, por maior que tenha sido a tragédia."

Noutras circunstâncias, a tentativa de Schvartsman de lustrar a logomarca que lhe paga os salários seria vista como algo natural. Porém, a reedição de Mariana e os 321 cadáveres de Brumadinho, 155 dos quais ainda desaparecidos, transformam qualquer ensaio de defesa da Vale numa ofensa. Não pode ser condenada? Espanto! Acidente? Estupefação. O doutor ainda não notou, mas o excesso de caixões e de lama ofuscaram o brilho da "joia" da mineração.

"Continuamos sem saber os motivos que causaram o acidente", declarou Schvartsman a certa altura. "Todas as informações que nós possuíamos e que foram enviadas pelos técnicos demonstravam que não havia qualquer perigo iminente sobre aquela barragem (de Brumadinho) e que não havia qualquer razão de alarme ou de preocupação maior da gestão da companhia." Hã?!?!? Ainda não conhecem as causas?

A essa altura, Fábio Schvartsman já não consegue assegurar nem a permanência da própria cabeça no alto do pescoço. Converteu-se numa substituição esperando para acontecer. Seu excesso de eficiência e seu acúmulo de boas intenções revelaram-se inutilidades a serviço da tragédia. Diante de um quadro assim, o melhor a fazer é evitar o malabarismo verbal, o trapezismo retórico e o ilusionismo administrativo. Do contrário, ficará a impressão de que a Vale deseja transformar os brasileiros em palhaços.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.