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Josias de Souza

Se Bebianno ficar, capitão será Napoleão do Twitter

Josias de Souza

15/02/2019 20h38

Jair Bolsonaro revelou-se nas últimas horas um presidente dotado de notável autossuficiência. Ele se basta a si próprio, não precisa de oposição. No caso do ministro Gustavo Bebianno, Bolsonaro juntou a lenha, ele mesmo riscou o fósforo, ele mesmo borrifou gasolina no fogo, ele mesmo pulou na fogueira. Descobriu-se que o presidente da República é um mestre na arte de magnificar os problemas que ele cria para si mesmo.

Como tudo no governo de Bolsonaro, a coisa começou no Twitter. Carlos Bolsonaro, filho e 'pitbull' do presidente, chamou de "mentiroso" Gustavo Bebianno, ministro-chefe da Secretaria Geral da Presidência. Descobriu-se depois que o filho 'Zero Dois' torpedeara o ministro com o aval do pai. Isso ficou claro porque Jair Bolsonaro ecoaria o filho no Twitter e numa entrevista à Record, sua emissora de estimação.

Bolsonaro informou ao país que, além de manter uma relação frágil com a verdade, Bebiano é suspeito. Por isso, ordenou ao ministro Sergio Moro que investigasse, com a PF, a denúncia de envolvimento do ministro no escândalo do repasse de verbas públicas do fundo eleitoral para candidaturas laranjas do PSL. O presidente afirmou que o ministro talvez tivesse que "retornar às suas origens", fora do governo.

Imaginou-se que, humilhado, Bebianno pediria pra sair. Deu-se, porém, o contrário. O ministro pagou pra ver. Mobilizou seus amigos no Congresso, articulou-se com o pedaço fardado do governo e pronunciou meia dúzia de declarações esquisitas. Por exemplo: "Não sou moleque, e o presidente sabe. O presidente está com medo de receber algum respingo."

Quem nomeia e demite ministros, como se sabe, é o presidente. Ao manter Bebianno no cargo Bolsonaro autorizou o país a enxergá-lo como um Napoleão do Twitter. É só ali, no ambiente volátil das redes sociais, que Bolsonaro é invencível. Na vida real, o capitão apavora-se com uma insinuação qualquer. Enxerga num reles subordinado "mentiroso" o risco de um Waterloo.

— Leia aqui notícia sobre a meia-volta de Jair Bolsonaro, que recolocou Gustavo Bebiano no rumo da porta de saída do governo.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.