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Josias de Souza

Queda de Bebianno revela-se inútil e desastrosa

Josias de Souza

18/02/2019 19h18

A operação que resultou no afastamento de Gustavo Bebianno revelou-se uma inútil e desastrosa iniciativa política. Foi inútil porque o envio do ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência para o olho da rua, não afastou o laranjal do PSL da figura do presidente, pois o ministro Marcelo Alvaro Antonio, envolvido no mesmo escândalo, continua dando expediente na pasta do Turismo. Foi desastrosa porque Bolsonaro conseguiu manter o problema velho criando duas encrencas novas: ganhou um desafeto detentor de muitos segredos e tornou-se um interlocutor inconfiável aos olhos dos congressistas com os quais o Planalto terá de negociar a aprovação da reforma da Previdência e do pacote anticrime.

Depois de fazer sua opção pelo desastre, Bolsonaro terá de molhar o paletó para livrar-se dos efeitos da crise que criou para si mesmo. O primeiro desafio será o de manter a língua de Bebiano dentro da boca. O presidente cuidou de divulgar um vídeo em que elogia o ministro "mentiroso". Há, de resto, intermediários encarregados de medir a pressão do personagem. Mas nada assegura que a humilhação a que Bebianno foi submetido não fará ferver a sua paciência. Simultaneamente, o presidente precisará convencer deputados e senadores de que sua palavra merece crédito mesmo depois de ter jogado ao mar um ministro declaradamente leal.

Se fosse votada hoje, a reforma da Previdência seria sepultada. Embora se declare avesso ao toma-lá-dá-cá, Bolsonaro terá de encostar o estômago no balcão para obter os 308 votos de que necessita na Câmara e os 49 de que precisa no Senado. A viabilidade do novo governo depende do crescimento da economia. Em política, não há popularidade sem prosperidade. E o ministro Paulo Guedes (Economia) condiciona a reação do PIB à mexida na Previdência. Os congressistas sabem disso. E a banda fisiológica do Legislativo venderá caro os seus votos. Nesse ambiente, filhos interferindo no governo do pai, por exemplo, não representam um problema, mas uma oportunidade de negócios.

A inutilidade desastrosa do afastamento de Bebianno serviu para encarecer o processo de tramitação legislativa das reformas prometidas por Bolsonaro. O sistema político é paradoxal. Ele permite que maluquices encantem parte do eleitorado e cheguem ao Planalto. Mas seus representantes no Congresso e no mercado financeiro não costumam bater palmas para maluco dançar. O governo de Bolsonaro tem pressa. Entretanto, os congressistas olham para a conjuntura encrespada com a sensação de que não perdem por esperar. Ganham!

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.