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Josias de Souza

Bolsonaro lida com a ética em duas velocidades

Josias de Souza

21/02/2019 20h53

O ex-ministro palaciano Gustavo Bebianno e o ministro do Turismo Marcelo Álvaro Antônio estão encrencados no mesmo escândalo do laranjal do PSL. Ao demitir Bebianno sem conseguir explicar as razões, Jair Bolsonaro revelou-se intelectualmente lento. Ao manter Marcelo Antônio no cargo sem que ele ofereça boas explicações, o presidente revela-se eticamente ligeiro.

As duas velocidades de Bolsonaro são insultuosas. A lentidão intelectual afeta a própria autoridade do presidente, pois prevalece a versão segundo a qual Bebianno foi demitido pelo filho-pitbull Carlos Bolsonaro. A ligeireza moral transforma em suco o discurso ético do presidente, que prometera honrar os eleitores que lhe deram votos no pressuposto de que ele saciaria a fome de limpeza que está no ar.

Descobre-se agora que o ministro do Turismo recorreu ao Supremo Tribunal Federal para trancar a investigação aberta contra ele pelo Ministério Público de Minas Gerais, transferindo-a para Brasília. Difícil saber o que é mais constrangedor, se a chuva de laranjas que cai sobre a cabeça do ministro ou a tentativa de se refugiar embaixo da marquise do foro privilegiado.

Se quisesse ser levado a sério, Bolsonaro demitiria o ministro do Turismo. Impossível tolerar um auxiliar que se diz inocente e foge da investigação que poderia livrá-lo da suspeição. Mas Bolsonaro está de mãos atadas. Seu ministro não fez senão repetir os passos do filho mais velho do presidente, senador Flávio Bolsonaro, que também tentou trancar no Supremo a investigação estadual sobre os achados do Coaf e o laranjal do ex-faz-tudo Fabrício Queiroz.

A esse ponto chegamos: ao manter o ministro do Turismo no cargo, Bolsonaro flerta com o escárnio. Se mandar o ministro para o olho da rua por ter imitado seu filho, o capitão se transformará no caso raro de uma piada que ocupa a Presidência da República.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.