Democracia de Bolsonaro é isenta de democratas
Nesta quinta-feira pós-Carnaval, Jair Bolsonaro discursou para uma plateia de militares no Rio de Janeiro. A certa altura, insinuou que a democracia brasileira só existe porque as Forças Armadas consentem. Disse que governará "ao lado das pessoas de bem do nosso Brasil, daqueles que amam a pátria, daqueles que respeitam a família, daqueles que querem aproximação com países que têm ideologia semelhante à nossa, daqueles que amam a democracia." E sapecou: "Isso, democracia e liberdade, só existe quando a sua respectiva Força Armada assim o quer."
Houve um tempo em que a "democracia" brasileira levava aspas. Nessa época, havia três poderes: Exército, Marinha e Aeronáutica. Após a redemocratização, quando o voto tirou as aspas da democracia, passaram a existir quatro poderes: o Executivo, o Legislativo, o Judiciário e o Dinheiro da corrupção, que antes era acobertado pela censura. Sob Bolsonaro, o sistema político brasileiro atingiu, finalmente, a perfeição. Virou uma democracia cuja Presidência está 100% isenta de democrata.
A conjuntura está crivada de ironias. Numa cruzada solitária, o capitão formou com o general Hamilton Mourão uma chapa puro-sangue militar. Cavalgando sobre os escombros de um sistema político apodrecido, prevaleceu sobre o petismo no segundo turno. De repente, informa aos seus 57 milhões de eleitores que o voto deles não passa de uma concessão dos militares. Para usar uma expressão que caiu nas graças do presidente, é como se Bolsonaro despejasse um "golden shower" sobre as urnas que o elegeram.
Por sorte, a mesma democracia que tolera um presidente que faz aliança preferencial com a tolice permite que os eleitores exerçam a cada quatro anos, com irrestrita liberdade, o inalienável direito de fazer besteiras por conta própria. Com a ajuda dos militares, que têm direito a voto. A despeito da possibilidade de alternância no poder, um jovem que ouve Bolsonaro discursando deve se perguntar: "Será que democracia é isso mesmo?"
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