Topo

Josias de Souza

Após arruinar MEC e Itamaraty, JB mira o IBGE

Josias de Souza

03/04/2019 06h02

Não bastasse a patrulha ideológica que produz a ruína do Ministério da Educação e do Itamaraty, Jair Bolsonaro, o JB, decidiu levar à alça de mira o IBGE, instituto responsável pelas estatísticas nacionais. Desafiado por índices aterradores de desemprego e desalento, o presidente dissolve as estatísticas na sua caudalosa ignorância técnica. Comporta-se como se preferisse retocar a radiografia a tratar da doença.

Bolsonaro briga com os indicadores desde a campanha eleitoral. Três meses depois de empossado, foge de uma reconciliação com a verdade. Munido de dados confiáveis, ele tira suas próprias confusões. E declara coisas assim: "Como é feita hoje em dia a taxa? Leva-se em conta só quem está procurando emprego. Quem não procura não é tido como desempregado."

Na qualidade de Posto Ipiranga, o ministro Paulo Guedes deveria abastecer Bolsonaro com meio litro de lucidez. Um dos grandes acertos do IBGE nessa matéria foi justamente o de separar as vítimas da falta de trabalho por categorias. O refinamento dos dados oferece aos agentes públicos a oportunidade de enxergar todas as nuances do flagelo.

Hoje, sabe-se que a legião que está no olho da rua e perambula de fila em fila atrás de vagas soma 13,1 milhões de cabeças. Aqueles cujo desalento impede de continuar procurando emprego são contados em 4,9 milhões. Juntando-se esses dois contingentes ao grupo que trabalha menos do que gostaria, verifica-se que a falta de trabalho atormenta um notável contingente de 27.9 milhões de brasileiros.

Recém-empossado, Bolsonaro não pode ser responsabilizado pelo drama que herdou. Mas se continuar desperdiçando tempo com a desqualificação do IBGE, não demorará a ser visto como parte do problema. Nos casos do MEC e do Itamaraty, a plateia já se deu conta que o problema não está nos ministros, mas no dono da caneta.

Moralmente ligeiro, Bolsonaro convive com ministros suspeitos (um deles é até condenado) e incompetentes. Politicamente devagar, o capitão faz oposição a si mesmo. Intelectualmente lento, demora a perceber que um presidente não deveria ofender quem merece respeito. Por ora, todas as velocidades com que Bolsonaro operou revelaram-se insultuosas.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.