Senado preferiu o ócio à discussão sobre o Coaf
Estava tudo programado. Assim que a Câmara concluísse a votação da medida provisória que redesenhou os ministérios, os senadores colocariam mãos à obra. Convocara-se uma sessão extraordinária para as 11h. Mas o presidente do Senado, dirigindo-se a um plenário ermo, comunicou o adiamento da votação para terça-feira. Alegou que a Câmara não concluíra o serviço. Meia-verdade. O trabalho da Câmara seria encerrado pouco depois do meio-dia. A questão é que os senadores preferiram usufruir do ócio do final de semana hipertrofiado a reabrir o debate sobre a localização do Coaf.
O brasileiro comum costuma molhar a camisa por cinco dias e meio. Folga no sábado à tarde e no domingo. Esse tipo de jornada recebe o nome de 'semana inglesa'. No Congresso, vigora a semana brasiliense. Nela, os parlamentares suam o paletó de terça até a manhã de quinta. Depois, voam para os seus Estados, onde permanecem pelo menos até segunda-feira. Se não for votada até 3 de junho, a MP que reorganizou os ministérios perde a validade. E a Esplanada, hoje com 22 ministérios, voltaria a ter 29 pastas. Na terça-feira (28), quando retornarem ao batente, os senadores estarão a seis dias do encerramento desse prazo.
Em tese, haveria tempo para rever decisões tomadas pela Câmara, como a que devolveu o Coaf à pasta da Economia, retirando o órgão das mãos do ministro Sergio Moro (Justiça). Mas a meia-volta talvez esticasse o debate até a quarta-feira. E a MP teria de ser devolvida à Câmara, para uma nova votação na quinta-feira. Nesse dia, os deputados é que estariam voando rumo à ociosidade. Retornariam na terça seguinte, 4 de junho. Tarde demais. A MP teria expirado na véspera.
Há um grupo suprapartidário de senadores dispostos a pegar em lanças para deixar o Coaf com Moro. Mas Jair Bolsonaro, velho conhecedor das mumunhas do Congresso, foge do risco. Numa de suas transmissões ao vivo pelas redes sociais, disse preferir que os senadores carimbem a medida provisória na versão aprovada pela Câmara, sem modificar uma vírgula.
Numa empresa, funcionário que estica o final de semana da tarde de quinta-feira à noite de segunda é mandado para o olho da rua. No Congresso, alega-se que o trabalho de deputados e senadores não se restringe ao plenário. Nessa versão, continuam dando expediente nos Estados, em permanente "contato com as bases". Ainda não inventaram melhor expressão para definir conversa fiada do que "contato com as bases."
O emprego de parlamentar é coisa extraordinária. O horário é bom. O dinheiro não é ruim: R$ 33,7 mil, noves fora os mais de R$ 100 mil para as despesas do mês. Há duas férias por ano. A casa é funcional. O plano de saúde, por ilimitado, cobre de tratamento de frieira a internação no Albert Einstein. Tudo isso e mais o prazer de convocar para depor ministros como Abraham Weintraub e Ernesto Araújo, da cota do Olavo de Carvalho. E pode-se desfrutar do final de semana gordo sem o inconveniente de ter que arrumar desculpas novas. Diferentemente do que ocorre com as medidas provisórias, a lorota do "contato com as bases" não tem prazo de validade.
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