Topo

Josias de Souza

Na contramão da rua, Capitão cede ao centrão

Josias de Souza

28/05/2019 17h18

Jair Bolsonaro considerou "significativo e histórico" o apoio que recebeu na manifestação do final de semana. "Não podemos ignorar", escreveu o presidente nas redes sociais. Nesta terça-feira, menos de 72 horas depois dos atos de domingo, o capitão ignorou o aval dos seus apologistas à permanência do Coaf nas mãos de Sergio Moro. Na contramão das ruas, Bolsonaro rendeu-se ao centrão.

A coragem é a arte de ter medo sem deixar transparecer. No caso de Bolsonaro, foi impossível salvar a pose. A capitulação do seu governo foi formalizada em carta. Endossado pelos ministros Sergio Moro (Justiça) e Paulo Guedes (Economia), o documento foi entregue ao presidente do Senado, Davi Alcolumbre, pelo ministro Onyx Lorenzoni (Casa Civil).

Roga-se no texto para que os senadores aprovem a medida provisória que reestruturou os ministérios no formato que já foi referendado pela Câmara, com o Coaf devolvido à pasta da Economia. Alega-se que o recuo é inevitável porque não haveria tempo para concluir o processo de votação, pois a medida provisória perde a validade na segunda-feira (3). Trata-se de uma lorota.

O tempo é curto. Mas o que falta ao governo é voto. Aprovada pelos senadores nesta terça-feira com o ajuste do Coaf, a MP retornaria à Câmara, para nova votação. Se houvesse um acordo, a Câmara teria a quarta e a quinta-feira para deliberar. O diabo é que um pedaço do centrão não se dispõe a entregar seus votos a Bolsonaro.

Para não correr o risco de ter de volta a estrutura ministerial de Michel Temer, com 29 ministérios em vez dos atuais 22, Bolsonaro piscou. E o líder do PSL no Senado, Major Olimpio, que articulava a devolução do Coaf a Moro, viu-se compelido a recolher as armas: "É muito difícil você defender quem não quer ser defendido."

Quer dizer: Bolsonaro preferiu ser oportunista, flutuando agarrado ao "significativo e histórico" apoio recebido das ruas, do que ir ao fundo com sua empáfia amarrada ao pescoço. Poderia ter experimentado o caminho alternativo da negociação. Mas isso é coisa para gente de coragem.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.