Retrocesso no Código Florestal pode custar caro
Fala-se muito de leis que não pegam no Brasil. Mas há no país uma lei irrevogável: a Lei da Selva. Estabelece que o mais forte pode comer o mais fraco. Com a força das mais de duas centenas de votos de que dispõe no Legislativo, a bancada ruralista decidiu mastigar o Código Florestal. Trata-se de uma lei que mal saiu do berço. Foi aprovada em 2012. E já passa por um processo de desfiguração.
Por um placar elástico —243 a 19 votos— os deputados aprovaram o texto-base de uma medida provisória que estica prazos para a recomposição de áreas desmatadas e concede anistia a desmatadores. Adensada por jabutis enfiados dentro do texto, a MP enviou para o beleléu a perspectiva de recuperação da vegetação em uma área equivalente a duas vezes o Estado de Sergipe.
Aprovada na Câmara, a medida provisória vai ao Senado. A ex-senadora, ex-ministra e ex-presidenciável Marina Silva, hoje líder do partido Rede, divulgou em suas redes sociais um vídeo que resume o que está em jogo (assista abaixo).
A medida provisória foi editada por Michel Temer. Mas seu conteúdo, piorado pelas emendas que os deputados adicionaram, combina com a política de terra arrasada que vigora no governo do sucessor Jair Bolsonaro. Tomado pelas posições que adota, o atual ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, parece tramar contra o ambiente inteiro.
O Brasil tornou-se uma potência agropecuária porque combinou o clima e o solo favoráveis com a incorporação de novas tecnologias ao processo produtivo. Bolsonaro e o pedaço troglodita do setor rural injetaram na agenda coisas como o afrouxamento da fiscalização do trabalho escravo no campo e a flexibilização dos controles ambientais.
Antes mesmo da investida contra o Código Florestal, 602 cientistas europeus assinaram uma carta sobre a encrenca ambiental no Brasil. Foi publicada em 26 de abril na conceituada revista Science. Recomenda-se no texto que os negócios com o Brasil sejam condicionados à redução do desmatamento e respeito aos direitos dos povos indígenas.
O ministro Salles deu de ombros: "Não somos os responsáveis pela mudança climática. Precisamos, sim, conter o desmatamento da Amazônia, que vem crescendo há mais de dois anos. Mas não vamos deixar que isso seja pretexto para que estrangeiros venham nos dizer onde e como devemos produzir alimentos."
A parceria firmada entre o ministro do Meio Ambiente e a banda retrógrada do ruralismo ainda vai custar caro aos exportadores de alimentos do Brasil. Hoje, já não basta produzir muito e bem. É preciso comprovar que o processo de produção é sustentável. Sob pena de arrostar a repulsa de consumidores ambientalmente conscientes.
– Atualização feita nesta quarta-feira (29), às 20h11: O Senado decidiu não votar a medida provisória sobre Código Florestal, que caducará na segunda-feira (3). Alvíssaras.
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