Topo

Josias de Souza

Secretário elogia a reforma que Guedes detona

Josias de Souza

14/06/2019 19h59

O ministro Paulo Guedes (Economia) detestou a proposta de reforma previdenciária apresentada na Câmara. "Abortaram a nova Previdência", disse ele. Curiosamente, um dos principais auxiliares de Guedes, o secretário especial de Previdência e Trabalho Rogério Marinho, gostou do projeto que seu chefe abomina. Para Marinho, a despeito das alterações feitas no texto original, a ecomomia de R$ 913 bilhões em dez anos será suficiente para produzir a "reestruturação e o equilíbrio fiscal no Brasil."

A avaliação de Marinho foi feita numa entrevista matutina à rádio Jovem Pan. Horas depois, Guedes diria que os cortes sugeridos pelo deputado Samuel Moreira (PSDB-SP), relator da reforma na Câmara, foram mais profundos do que ele imaginava. O texto original previa economia de R$ 1,2 trilhão em uma década. O governo topara chegar a R$ 1 trilhão. Para o ministro, a Câmara cedeu às "pressões corporativas de servidores do Legislativo", a quem chama de "privilegiados".

Marinho dissera coisa bem diferente: "O ministro Paulo Guedes, em várias intervenções públicas, já falava a respeito da necessidade de termos pelo menos R$ 1 trilhão de impacto fiscal —R$ 913 bilhões é muito próximo do número que o ministro falou. É evidente que esse número nos deixa confortáveis. Esperamos que não haja nenhuma retirada maior."

O diabo é que, na conta do ministro, a ecomomia será de apenas R$ 860 bilhões. Ele desconsidera o anabolizante de R$ 50 bilhões injetado na cifra a partir de uma elavação do imposto cobrado sobre o lucro dos bancos. Avesso à elevação da carga tributária, Guedes considera que o aumento de imposto é política tributária, não previdenciária.

Sobre esse ponto, Rogério Marinho soara, novamente, na contramão do ministro: "O Parlamento tem a autonomia de fazer a proposta que fez. E foi fruto de uma concertação com a grande maioria dos líderes dentro do Parlamento brasileiro. O trabalho de negociação que permitiu a apresentação do projeto é uma demonstração de que o Parlamento brasileiro está vivo."

Marinho foi ao ponto: "Esse aumento dado no [imposto sobre o] lucro líquido dos bancos já existia até dezembro de 2018. Então, ele está sendo restabelecido pelo Parlamento brasileiro. Esse governo já se comprometeu em não aumentar tributos. Não é uma posição do governo federal. Porém, a gente precisa respeitar a autonomia do Parlamento. Vamos examinar se terá condições objetivas de aprovar dentro da comissão e, posteriormente, nas duas Casas" do Congresso.

Tomado pelas palavras, Marinho acreditava que Guedes também apreciaria a proposta produzida na Câmara: "O que o ministro tem dito é que em torno de R$ 1 trilhão é suficiente para resolvermos a questão estrutural do país e da Previdência. E isso vai ser alcançado. É uma vitória da sociedade do Parlamento, do governo e do Estado brasileiro."

Surpreendido pelas declarações de Paulo Guedes, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, lamentou que o ministro tenha aderido à "usina de crises" que se instalou no governo de Jair Bolsonaro.

Errata: O ministro da Economia, Paulo Guedes, foi erroneamente identificado no último parágrafo desse texto como presidente da Câmara. O erro foi corrigido.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.