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Josias de Souza

Retórica do capitão contra velha política vira suco

Josias de Souza

27/06/2019 12h04

Em seis meses de governo, Jair Bolsonaro demitiu quatro ministros. Na última leva, ao justificar o afastamento de auxiliares palacianos, entre eles dois militares, disse que certos ministros são como fusíveis. "Para evitar queimar o presidente, eles se queimam." Em relação ao titular da pasta do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, inverteu-se a lógica. Para não fritar o ministro, o capitão submeteu-se a um inusitado processo de autocombustão. Agora, com a imagem em franco processo de carbonização, Bolsonaro terá de fazer por pressão o que não fez por opção.

Em operação deflagrada nesta quinta-feira, a Polícia Federal cumpriu três ordens de prisão. Coisa relacionada ao inquérito sobre o uso de dinheiro público na irrigação de candidaturas de laranjas do PSL. Foram recolhidos um assessor e dois ex-assessores de Marcelo Álvaro Antonio. Ficou-se com a impressão de que, não fosse o foro privilegiado, o próprio ministro poderia ter recebido a visita matutina dos rapazes da PF.

Bolsonaro, como se sabe, especializou-se na arte de armar emboscadas para si mesmo. Ordenara a Sergio Moro, ministro da Justiça, que acionasse a Polícia Federal para investigar o caso das candidaturas laranjas do PSL. Simultaneamente, manteve na poltrona do Turismo um protagonista do escândalo. Conseguiu transformar a queima da reputação de um ministro num incêndio que consome a autoridade presidencial.

Além de eletrocutar a imagem do presidente, a permanência do ministro no cargo leva à liquefação do discurso de Bolsonaro. O lero-lero contra a velha política vai virando suco… De laranja.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.