Reforma previdenciária muda geografia do poder
A articulação que tornou provável a aprovação da reforma da Previdência transformou os hábitos e a geografia de Brasília. Virou pó a ideia de que o presidente manda e os congressistas obedecem. O bunker da maioria parlamentar migrou do Planalto para a residência oficial da presidência da Câmara. Nesta terça-feira, horas antes do início do processo de votação, Jair Bolsonaro resumiu com um gesto a nova realidade. Autoanulando-se, o capitão deu conteúdo militar à liderança de Rodrigo Maia. Promoveu o presidente da Câmara à patente de "nosso general".
Noutros tempos, a articulação política passava pelo Planalto. Sob Bolsonaro, a Presidência chega à votação da "mãe de todas as reformas econômicas" com dois articuladores —Onyx Lorenzoni e o general Luiz Eduardo Ramos— e nenhuma articulação. A prioridade do bloco pró-reforma é impedir que o presidente e o partido dele, o PSL, continuem atirando contra o próprio pé a pretexto de premiar corporações policiais com vantagens que enfraqueceriam o já frágil lero-lero do fim dos privilégios.
Instalado no Ministério da Economia, Paulo Guedes ofereceu ajuste fiscal. Fez isso num instante em que o abismo financeiro em que o Tesouro Nacional foi metido transforma em maluco quem ousa dizer que as contas públicas podem continuar como se encontram. Mas o Posto Ipiranga perdeu os direitos autorais sobre a reforma ao declarar que os deputados, com suas concessões corporativas, "abortaram a nova Previdência."
Hoje, escanteado pelos parlamentares, Guedes dedica-se a administrar os humores de Bolsonaro, para evitar que as ambiguidades do chefe desidratem uma reforma que, se não é a ideal, roça o fetiche do ministro de obter uma economia de R$ 1 trilhão em dez anos. Qualquer coisa acima de R$ 900 bilhões deixará tostada a língua do todo-poderoso da Economia, potencializando a estratégia de Rodrigo Maia de apresentar a reforma como obra do Legislativo. Nas palavras do deputado, a Câmara entrega uma reforma "robusta" sem as "maldades" que o governo tramara contra os trabalhadores rurais e velhinhos pendurados no BPC.
Ironicamente, a proposta da Previdência não teria chegado ao estágio atual sem o auxílio do famoso "centrão". Bolsonaro disse que o termo virou "palavrão". Paulo Guedes estava pensando no grupo quando mencionou, em seu discurso de posse, as "criaturas do pântano político". Pois nada se faz na Câmara sem os votos do centrão, para o bem e para o mal. Guindado à presidência da Câmara com o apoio das "criaturas", Maia caminhou sobre o pântano para obter os votos que o governo afugentava. Foi preciso liberar emendas orçamentárias. Mas elas agora são obrigatórias. E o benefício do equilíbrio previdenciário compensa o custo.
Como o buraco é grande, uma reforma só não resolverá o problema. Confirmando-se a aprovação da mexida previdenciária, o governo precisa informar que novo itinerário deseja tomar. A equipe de Paulo Guedes se equipa para colocar na rua um lote de providências. As iniciativas do ministro terão de se conciliar com a agenda do Congresso. Rodrigo Maia tomou gosto pela condição de "general". Mandou abrir um portão nos fundos da residência da Câmara. Cruzando-o, chega à casa oficial do presidente do Senado, Davi Alcolumbre. Juntos, elaboram a pauta do Legislativo. Nesta quarta-feira, Maia constitui a comissão que cuidará da reforma tributária. Continuará um passo à frente do governo.
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