Se for honesto e terrivelmente competente, evangélico no STF será bem-vindo
Jair Bolsonaro reafirmou nesta quarta-feira sua intenção de acomodar um evangélico no Supremo Tribunal Federal. Em maio, fizera uma indagação: "Será que não está na hora de termos um ministro do STF evangélico?" Agora, soou categórico: "Eu poderei indicar dois ministros ao Supremo Tribunal Federal. Um deles será terrivelmente evangélico", disse.
O que diz a Constituição? O escolhido precisa ter mais de 35 anos e menos de 75 anos. De resto, é preciso ostentar duas qualidades: "notável saber jurídico" e "reputação ilibada". Não há no texto constitucional vestígio de condicionantes religiosas. Quer dizer: se for honesto e terrivelmente competente no manuseio das leis, o evangélico a ser indicado por Bolsonaro será muito bem-vindo.
Num colegiado de 11 ministros, um evangélico só talvez não seja suficiente para fazer verão. Em matéria de costumes, a Suprema Corte é avançada. Coleciona decisões que favoreceram a ciência, minorias e grupos sociais vulneráveis.
Por exemplo: o reconhecimento da legalidade das pesquisas com células tronco, a validação da Lei Maria da Penha, a interrupção da gravidez em casos de fetos anencefálicos, o direito ao aborto no primeiro trimestre da gravidez, o reconhecimento da união homoafetiva e a equiparação da homofobia ao crime de racismo.
Foi graças à criminalização da homofobia que Bolsonaro revelou em maio sua intenção de premiar um evangélico. O presidente queixou-se de que o Supremo estaria "legislando". A crítica soou esquisita nos lábios de alguém que invadiu a competência do legislativo ao baixar por decreto regras sobre armas que dependeriam da aprovação de projeto de lei.
No plano pessoal, a filosofia de vida do evangélico a ser prestigiado por Bolsonaro não interessa a ninguém. Numa poltrona do Supremo, o pensamento do futuro magistrado interessará ao país. Ali, o religioso será apenas um servidor público de um Estado laico.
Nesse Estado, a violência contra homessexuais e a união entre pessoas do mesmo sexo são dados da realidade. Ao criminalizar a homofobia, o Supremo apenas equipa o Judiciário para punir criminosos. Ao legalizar a união homoafetiva, permite que mais brasileiros tenham direito a uma vida comum, partilhando desde planos de saúde até bens e imóveis.
Não se deve esquecer que o escolhido do presidente depende de aprovação do Senado. No mais, resta rezar para que Bolsonaro, declaradamente católico, se inspire no papa Francisco. O pontífice já declarou que a Igreja deve perdão aos homosexuais por tê-los marginalizado.
"Se uma pessoa que tem essa condição tem boa vontade e procura por Deus, quem somos nós para julgar?", disse o papa. Em sentido oposto, se um brasileiro que tem algum direito violado bate às portas do Supremo, cabe aos magistrados julgar. E o livro de consulta no templo do Supremo é a Constituição, não a Bíblia.
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