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Josias de Souza

Filho de Bolsonaro em embaixada é um erro triplo

Josias de Souza

11/07/2019 23h48

Eis a penúltima de Jair Bolsonaro: o presidente informou que pretende nomear o deputado federal Eduardo Bolsonaro para o posto de embaixador do Brasil nos Estados Unidos. Em entrevista, expôs as credenciais do filho Zero Três: "Ele é amigo dos filhos do Donald Trump, fala inglês e espanhol, tem uma vivência muito grande do mundo. Poderia ser uma pessoa adequada e daria conta do recado perfeitamente." Se confirmada, a indicação será imprópria, insultuosa e desrespeitosa.

Será imprópria porque a acomodação de um filho em posto público de tal relevância é coisa de autocrata nepotista. Será insultuosa porque o Bolsonaro preterirá inúmeros embaixadores à disposição nos quadros do Itamaraty. Será desrespeitosa porque Eduardo jogará no lixo os votos de 1,8 milhão de eleitores paulistas, renunciando ao mandato.

O nepotismo está tipificado na súmula 13 do Supremo Tribunal Federal. Anota que "a nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica, investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada na administração pública direta e indireta, em qualquer dos poderes da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição". Ou seja: haverá questionamento jurídico. É certo como o nascer do Sol a cada manhã.

Ser "amigo dos filhos de Trump" e falar um par de idiomas não são credenciais suficientes para comandar a embaixada em Washington, posto mais relevante mantido pelo Brasil no exterior. Está vago desde abril, quando Bolsonaro ejetou da poltrona, sem motivo aparente, o experiente embaixador Sergio Amaral. O substituto precisa ter qualificação diplomática, econômica e administrativa. Isso exige anos de formação. Há no Itamaraty opções de mostruário. É só escolher. Não há precedente de indicação de forasteiros para esse posto. Muito menos de filho.  

A renúncia ao mandato de deputado é ato unilateral. Mas mexe com o desejo de todos os eleitores que enxergaram no Zero Três credenciais para representá-los na Câmara até o ano da graça de 2022. A interrupção voluntária desse, digamos, contrato político tem nome: estelionato eleitoral. O primeiro da fila para ocupar a vaga é o suplente Sattin Rodrigues (PSL). Obteve exíguos 25,9 mil votos —um asterisco, perto da legião que votou em Eduardo Bolsonaro.

Convém lembrar que as indicações de embaixadores precisam passar pelo Senado. O escolhido passa por sabatina na Comissão de Relações Exteriores. Se for aprovado ali, o nome vai ao plenário. Por uma trapaça da sorte, a votação é secreta. Os senadores constumam ser condescendentes. Mas Bolsonaro, movido por uma ideia fixa de criar polêmicas, decidiu cutucar os senadores para ver se eles mordem. Esse pode ser o seu quarto erro neste caso.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.