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Josias de Souza

Guedes libera o paliativo e retarda o estrutural

Josias de Souza

17/07/2019 20h07

Jair Bolsonaro antecipou nesta quarta-feira o afago que o ministro Paulo Guedes e sua equipe econômica farão nesta semana nos bolsos dos brasileiros que convivem com a sobra de mês no fim do salário. Será liberado o saque de um pedaço do FGTS. Coisa estimada entre R$ 30 bilhões e R$ 42 bilhões. Serão reabertas também as torneiras do PIS-Pasep. Há algo como R$ 21 bilhões disponíveis, mas cogita-se liberar cifra inferior. São providências bem-vindas. Mas não passam de paliativos. Falta levar à vitrine um lote qualquer de ajustes estruturais.

Não há originalidade no método. Michel Temer já havia devolvido aos verdadeiros donos parte do dinheiro arrancado dos trabalhadores e mantido sob a guarda do Estado em poupança compulsória, que paga rendimentos menores do que os obtidos em outras aplicações. A diferença é que Temer havia liberado apenas contas inativas do FGTS. Como o tacho foi raspado, Bolsonaro terá de soltar parte das contas ativas, além de parte do que sobrou do PIS/Pasep.

Despejado sobre uma conjuntura de estagnação econômica, parte do dinheiro vai para o pagamento de dívidas. Espera-se que outro naco vá para o consumo. Coisa suficiente para produzir o que os economistas chamam pejorativamente de "voo de galinha". Exatamente como aconteceu sob Temer.

O movimento mais perene, com potencial para religar as caldeiras da economia, depende de outro tipo de providência. Que Paulo Guedes, inexplicavelmente, retarda. Alegava-se que era necessário esperar pelo avanço da reforma da Previdência. A despeito do governo, a mexida previdenciária avançou na Câmara. Está na bica de chegar ao Senado. E nada.

Vendeu-se a ilusão de que a mudança na Previdência, uma espécie de sorvo de gigante que retirará de circulação entre R$ 800 bilhões e R$ 900 bilhões em dez anos, traria de volta os empregos. É hora de falar sério. A redução do déficit previdenciário é apenas parte da solução. Atenua o risco de insolvência do Estado e ajuda a restabelecer a confiança de investidores. Mas há muito por fazer.

Difícil entender por que a pasta da Economia demora a expor sua proposta de reforma tributária, seu programa de concessões, seu roteiro de privatizações, seu modelo de reformulação do serviço público… Diz-se que o forno de Paulo Guedes está prestes a ser aberto. Mas o atraso é gritante. O ritmo do ministro não combina com a pressa dos 13 milhões de brasileiros desempregados. Esse pedaço da população, sem carteira assinada, não tem acesso nem ao paliativo do FGTS.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.