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Josias de Souza

Capitão motosserra devasta seu próprio prestígio

Josias de Souza

02/09/2019 14h13

A popularidade de Jair Bolsonaro passa por um fenômeno muito parecido com um desmatamento. O Datafolha informa que o índice de reprovação do presidente, que era de 33% no início de julho, subiu para 38%. Ou seja, entre julho e agosto, abriu-se uma clareira de 5 pontos percentuais. O mais inusitado é que isso aconteceu sem o auxílio da oposição. Bolsonaro devasta o próprio prestígio sozinho. Submete sua popularidade a um processo de autocombustão.

Há focos de incêndio conhecidos, que Bolsonaro não conseguiu debelar. Cresce a aversão ao presidente, por exemplo, entre as mulheres, os brasileiros mais pobres e os moradores do Nordeste. Para piorar, acenderam-se focos novos de desgaste. O prestígio de Bolsonaro arde também em nichos do eleitorado que ajudaram decisivamente a levá-lo ao Planalto. Por exemplo: homens, moradores da região Sul e brasileiros de alta renda e escolaridade.

Bolsonaro mantém relativamente preservada uma reserva de apoiadores mais fieis. Somavam 33% em julho, somam 29% agora. Quer dizer: mesmo nessa bolha o viés é de baixa. O presidente já se definiu como capitão motosserra. Quem opera o equipamento é sua língua. Ela fala dez vezes antes que o dono consiga pensar. Fez isso ao comentar os resultados do Datafolha: "Você acredita em Papai Noel?", perguntou a língua ao repórter que inquiriu o presidente sobre o tema.

A boa notícia é que o governo está apenas começando. A má notícia é que, tomado por sua capacidade de produzir crises do nada, Bolsonaro não oferece muitos motivos para quem deseja avaliá-lo de forma positiva. O mais trágico é que, ao devastar a lógica e o bom senso ao seu redor, Bolsonaro cria um ambiente de instabilidade econômica que mantém acesas as chamas que consomem o seu prestígio.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.