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Josias de Souza

Mortes caem do inacreditável para o inaceitável

Josias de Souza

10/09/2019 20h38

A notícia de que o número de assassinatos no Brasil caiu pela primeira vez em três anos é animadora e frustrante. A novidade anima porque o monturo de corpos executados com violência caiu 10,4%. A estatística frustra porque desceram à cova em 2018 nada menos que 57.341 vítimas. Significa dizer que evoluímos do inacreditável —mais de 64 mil mortes violentas em 2017— para o inaceitável patamar atual.

O mais inquietante é que ainda não há conclusões categóricas sobre as causas da redução. O que há, por ora, são hipóteses. Atribui-se uma parte do êxito a governos estaduais que desenvolveram políticas voltadas especificamente para a queda das mortes violentas. Mencionam-se, por exemplo, Espírito Santo e Pernambuco.

Imagina-se que parte do índice murchou também por inércia. As duas maiores facções criminosas do país —PCC e Comando Vermelho— entraram em guerra em 2016. Disputaram território no Norte e Nordeste. O sangue escorreu com mais intensidade em 2017, inflando o índice de mortes violentas. Em 2018, a anormalidade tornou-se menos anormal.

Os dados colecionados pelo Ministério da Justiça indicam que a tendência de queda se mantém neste ano de 2019. A equipe do ministro Sergio Moro mergulha nas estatísticas à procura de luz. O momento seria propício para a produção de uma realidade inteiramente nova. Caos não falta. O problema é que Jair Bolsonaro, eleito como solução por mais de 57 milhões de brasileiros, tornou-se parte do problema ao conspirar contra a estabilidade do ministro que escolheu e dar de ombros para o pacote anticrime que Sergio Moro imaginava que aprovaria em seis meses.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.