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Josias de Souza

CPMF transformaria Bolsonaro em ex-Bolsonaro

Josias de Souza

11/09/2019 23h01

A queda de Marcos Cintra da chefia da Receita Federal e o provável arquivamento da ideia de recriar a a CPMF livram Jair Bolsonaro de um incômodo. Até o ministro Paulo Guedes, da Economia, já havia encampado em público a proposta de criar um imposto sobre transações financeiras (pode me chamar de CPMF). Algo que Bolsonaro, do hospital, diz estar descartado.

Em termos econômicos, a volta da CPMF seria como retirar da cartola um coelho que propiciaria arrecadação de R$ 150 bilhões por ano. Não é pouca coisa. Do ponto de vista político, a mágica produziria uma metamorfose. Jair Bolsonaro seria transformado diante dos olhos da plateia num ex-Bolsonaro.

Como deputado, Bolsonaro desancou a CPMF. Sob FHC, chamou-a de "desgraça". Sob Lula, disse que era coisa de "cara de pau". Votou contra a criação do tributo e a favor de sua extinção. Como presidenciável, Bolsonaro recitou todos os defeitos da CPMF. E assegurou que, eleito, jamais admitiria a volta da encrenca.

Contra um pano de fundo como esse, marcado pela ambiguidade de um secretário do Fisco e de um ministro que defendiam algo que o presidente dizia abominar, a inclusão da nova modalidade de CPMF na proposta de reforma tributária do governo seria um oportunismo fiscal a serviço dos inimigos. Alegava-se que a volta da CPMF viria em benefício da criação de empregos, pois a folha salarial seria desonerada.

Nessa versão, o governo ofereceria um sacrifício à vista —a mordida no bolso dos brasileiros— e um benefício a prazo— a hipotética criação de empregos. Algo que depende da recuperação da economia. A conversão de Bolsonaro em ex-Bolsonaro talvez fizesse sentido se existisse no Congresso disposição para aprovar a aventura. Como a chance de o novo tributo emplacar no Legislativo é inexistente, a iniciativa do governo estava se convertendo apenas numa tolice.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.