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Josias de Souza

Zero Três virou caso de cassação de mandato

Josias de Souza

31/10/2019 15h14

A loucura tem razões que a sensatez desconhece. Jair Bolsonaro é um ex-capitão que deixou a tropa depois de um episódio de indisciplina. Chegou ao Planalto com mais de 57 milhões de votos, numa ascensão meteórica que coroou 28 anos de vida parlamentar. E seu filho querido, Eduardo Bolsonaro, eleito deputado com a maior votação do país, achou que seria uma boa ideia defender numa entrevista a volta do AI-5, o mais draconiano ato institucional da ditadura militar, que mergulhou o Brasil nas trevas.

Impossível contemporizar. Se isso não acabar no plenário da Câmara  na forma de um processo de cassação por quebra do decoro parlamentar, ficará entendido não que Eduardo Bolsonaro está meio maluco, mas que o Legislativo está completamente doido. Como alternativa para combater uma hipotética radicalização de esquerda, o príncipe herdeiro sugere uma legislação repressora qualquer, "aprovada através de um plebiscito".

O plebiscito é uma forma de expressão da vontade do povo. Está previsto na Constituição. Entretanto, a defesa de plebiscitos nos lábios do filho de um presidente que acaba de ser eleito é uma ideia golpista destinada a emparedar o Congresso, à moda de Hugo Chávez. É uma maluquice dentro da outra. A pretexto de se contrapor a um inexistente levante esquerdista de rua, o filho do monarca sugere a adoção do veneno como antídoto.

Esse penúltimo despautério produzido no seio da primeira-família chega dias depois da estupidez anterior, que foi a veiculação do vídeo em que o presidente-leão estava cercado por hienas-rivais. Bolsonaro desculpou-se pelo post que Carlos Bolsonaro, o príncipe Zero Dois, disse que ele mesmo havia divulgado. Desculpas já não resolvem. Pode-se apagar um vídeo do Twitter. Mas é impossível deletar os pendores autoritários do DNA dos Bolsonaro. Por sorte, a democracia tem remédios contra esse tipo de patologia.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.