Topo

Josias de Souza

Julgamento do STF expõe a lambança de Toffoli

Josias de Souza

28/11/2019 19h46

A montanha do Supremo Tribunal Federal pariu o óbvio: a maioria dos ministros reconheceu que os órgãos de controle foram criados para controlar. Quando submetidos a indícios de crimes têm a obrigação de compartilhar os dados com as autoridades encarregadas de investigar e denunciar criminosos. Dizia-se que o Supremo cogitava restringir o compartilhamento de informações sigilosas com o Ministério Público para proteger o cidadão. Proteção do cidadão tornou-se um luxuoso eufemismo para conversa fiada.

O texto da Constituição prestigia a privacidade do cidadão. Mas o escudo constitucional não pode ser erguido para proteger criminosos. Sobretudo num país como o Brasil, em que a corrupção se tornou endêmica. O resultado do julgamento do Supremo precisa produzir pelo menos duas consequências.

A primeira, inquestionável, é o reconhecimento de que Dias Toffoli, presidente do Supremo, fez uma lambança ao congelar há quatro meses a investigação contra Flávio Bolsonaro e outros 935 inquéritos. Na semana passada, ao proferir o voto mais longo e confuso da história do Supremo, Toffoli referiu-se à Receita e ao Coaf como fornecedores de material para "investigações de gaveta, que servem apenas para assassinar reputações". Deveria se desculpar pela generalização.

A segunda consequência, ainda pendente de verificação, é o descongelamento dos inquéritos —o que envolve Flávio Bolsonaro e todos os demais. Dias Toffoli chamou de "lenda urbana" a informação de que o julgamento diz respeito também ao filho do presidente da República. Não tem nada a ver, disse ele. No Supremo, nada virou sinônimo de tudo. O Zero Um precisa abandonar o cinismo das firulas jurídicas. Passa da hora de o filho do presidente levar meio quilo de explicações à balança da Justiça.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.