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Josias de Souza

Joaquim Levy será saco de pancadas no Congresso que PT fará no mês de junho

Josias de Souza

19/04/2015 05h06

O PT realizará entre os dias 11 e 13 de junho, em Salvador, o seu 5º Congresso. As correntes políticas que coabitam a legenda redigiram sete "teses" expondo suas propostas para enfrentar a corrosão do petismo e do governo Dilma Rousseff. Reunidos num caderno que pode ser lido aqui, os textos têm algo em comum: todos criticam a política de arrocho fiscal de Joaquim Levy. O ministro da Fazenda será tratado no encontro do partido da presidente da República como saco de pancadas.

O ajuste fiscal foi malhado até pela corrente majoritária do PT, à qual pertence Lula. Chama-se CNB, Construindo um Novo Brasil. No seu documento, batizado de "manifesto", o grupo lamenta "que a sociedade não tenha sido consultada sobre as medidas —apenas informada a posteriori— e que o peso do 'ajuste' proposto tenha recaído mais sobre os trabalhadores do que sobre outros setores das classes dominantes."

"Essas práticas", prossegue o texto, "foram em grande parte responsáveis pelo mal-estar de muitos movimentos sociais que lutaram pela eleição de Dilma e que, hoje, se encontram perplexos e frustrados com as primeiras medidas do governo." O documento anota que cabe "à bancada do PT e a outros parlamentares progressistas proporem as emendas necessárias" ao ajuste de Levy, ainda pendente de votação no Congresso.

Deve-se a redação do documento da corrente de Lula ao assessor da Presidência da República para assuntos Internacionais, Marco Aurélio Garcia. Ao resumir as impressões que recolhera do grupo, ele escreveu que "o governo está pressionado pela necessidade de uma solução de curto prazo para seus problemas fiscais." Avaliou que "os meios econômicos e financeiros internacionais querem que o 'ajuste' seja o ponto de inflexão de nossa política econômica em direção ao conservadorismo."

Para o CNB, "o que está em jogo é fazer um movimento que restabeleça o equilíbrio das contas públicas e permita novas condições para uma nova e forte retomada do processo de desenvolvimento. Esse movimento não se pode fazer confrontando os trabalhadores." Mais: na visão do grupo, é preciso apresentar novas medidas, que apontem para a retomada do crescimento econômico. "Não se pode fazer da necessidade de sanear a situação fiscal a ocasião para a apologia de uma política econômica conservadora, cujas consequências bem conhecemos."

A segunda maior corrente do PT, chamada Mensagem, carregou ainda mais nas tintas. Em texto que traz a caligrafia de Tarso Genro, ex-ministro de Lula e ex-governador gaúcho, o grupo sustenta que, passada a disputa presidencial de 2014, o PT perdeu a "capacidade comunicativa" que obtivera graças ao horário eleitoral no rádio e na tevê e à estrutura que montara para exibir-se na internet.

Sem o aparato de propaganda da campanha, conclui o texto, estabeleceu-se "uma cisão na narrativa e na unidade política" da base social do PT. "Em particular com as escolhas do Ministério da Fazenda e suas primeiras decisões." No dizer de Tarso Genro, "o segundo governo Dilma se iniciou com uma clara inflexão conservadora na gestão macroeconômica, contraditória com o programa eleito."

O grupo de Tarso, ao qual pertence também o ministro José Eduardo Cardozo (Justiça), acha que é preciso reconciliar a ação econômica da presidente com o "programa" vendido na campanha eleitoral. Do contrário, "o segundo governo Dilma trabalhará, na melhor das hipóteses, com um cenário de baixo crescimento e eventual crescimento do desemprego, crescimento residual das políticas sociais, em um contexto de ajuste virtual vicioso, rigidez inflacionária e dificuldades crescentes na balança de pagamentos."

A corrente minoritária Articulação de Esquerda escreveu em sua tese: "Implementar, mesmo que parcialmente, o programa dos derrotados na eleição contribui para confundir, desorganizar e dispersar as forças que venceram as eleições presidenciais de 2014, facilita as operações de sabotagem implementadas pela oposição de direita e também por setores da base do governo, não ajuda a bloquear eventuais tentativas de interromper nosso mandato, além de criar um ambiente favorável aos que desejam nos derrotar nas eleições de 2016 e 2018."

Os ataques a Levy crescem na proporção direta da diminuição do relevo das correntes que redigiram as teses. Uma delas, Diálogo e Ação Petista, anotou em seu documento que "o PT está diante da maior crise de sua história." E vaticinou, em timbre dramático: "Ou mudamos a política do partido e a política do governo Dilma ou corremos o risco de sofrer uma derrota profunda, que afetará não apenas o PT, mas o conjunto da esquerda…"

Para esse grupo, os apoiadores de Dilma foram submetidos a "um choque" depois que a presidente prevaleceu sobre Aécio Neves na sucessão do ano passado. Atribui o curto-circuito ao "giro da presidente reeleita, com o Plano Levy." O texto recorda um dos compromissos que Dilma assumira na campanha presidencial.

"Ao contrário do discurso do segundo turno ('nem que a vaca tussa'), […] assumiu-se parte do programa dos derrotados, com medidas de ajuste fiscal recessivo (restrição de direitos, contingenciamento de verbas, impostos para reduzir o consumo etc.), só para retomar o superávit fiscal primário e entregar aos especuladores e banqueiros." Antes de virar ministro, Levy era diretor do Bradesco. Na eleição, votara em Aécio Neves.

A corrente Diálogo e Ação torce o nariz sobretudo para o coração do ajuste de Levy, que pulsa nas medidas provisórias 664 e 665. "Condenadas pela CUT e demais centrais sindicais", diz o texto, essas MPs "reduzem o acesso a direitos previdenciários e trabalhistas e atacam a classe que mais decididamente pode defender o governo" contra "as ameaças de impeachment e o cerco exercido pelo comando das duas Casas Congresso" (leia-se Eduardo Cunha e Renan Calheiros).

Outra corrente minúscula do PT —Virar à Esquerda— denuncia já no título de sua tese o que acha das ideias do ministro Levy. Eis o nome da peça: "Abaixo a Política de Austeridade." Quem percorre todas as teses reunidas no caderno preparado pelo PT percebe que, embora ausente do encontro, o ministro da Fazenda frequentará o Congresso do PT como um personagem indefeso.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.