Eximir-se de culpa não absolve governo Temer
Dilma Rousseff deixou para Michel Temer tudo o que tinha: um Estado quebrado, inflação alta, recessão recorde e desemprego a pino. Nesta sexta-feira, num evento público, Temer tomou distância da herança. Fez isso, segundo explicou, para que daqui a dois ou três meses não o acusem de ser o responsável pelo "passivo". É sempre bom deixar as coisas mais claras. Entretando, chover no molhado não resolverá o estrago provocado pela tempestade.
Por trás do legado maldito "estão homens e mulheres que pagam um preço inaceitável", discursou Temer. "Chegamos a quase 12 milhões de desempregados. E reitero que não foi culpa minha." Beleza. O problema é que, se Deus tiver que aparecer para os desempregados, não se atreverá a surgir em outra forma que não seja a de um contracheque no final do mês. Um presidente que não seja capaz de apresentar mais soluções do que lamentações se parecerá sempre com um culpado.
É longa a lista de problema, disse Temer, antes de pintar o quadro com tintas fortes: "A crise que enfrentamos é a mais grave da nossa história. Não quero assustá-los, mas motivá-dos para que juntos possamos sair dessa crise. A causa é basicamente interna e fiscal. O Estado endividou-se muito além de sua capacidade, e gerou recessão e desemprego."
No ano passado, quando a Câmara se preparava para abrir o processo de impeachment contra Dilma, o Datafolha informou que 60% dos brasileiros desejavam o impedimento da então presidente petista e também do seu vice. Depois que a deposição foi confirmada pelo Senado, Temer não teve os cem dias de tolerância a que todo novo governo tem direito, segundo uma lei não escrita mas geralmente respeitada na política.
A deferência da trégua foi negada a Temer por duas azões: 1) seu governo não é novo. Além de ser sócio do fiasco petista, o PMDB manteve no primeiro escalão o mesmo centrão partidário que vendeu sua fidelidade a Lula e Dilma nos últimos 13 anos; 2) a herança de Dilma não caiu no colo de Temer por acaso. Cúmplice do petismo na degradação ética, o PMDB lutou por ela.
Assim, Temer chegou ao Planalto sem votos, como solução constitucional para o descalabro. Tem diante de si um caos à espera de um gerente. Ou mostra serviço ou logo será tão culpado quando sua antecessora.
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