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Josias de Souza

Federação de jornalistas ecoa PT: ‘Farsa judicial’

Josias de Souza

22/01/2018 20h49

A Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) divulgou nesta segunda-feira (22) uma nota oficial. O título anota: "Em defesa da Democracia e do Estado Democrático de Direito." Mas o texto contém, na verdade, uma enfática defesa de Lula. Quem lê o documento descobre que, para a entidade máxima do sindicalismo jornalístico, democracia é um outro nome para a absolvição de Lula. Um veredicto adverso no julgamento do recurso do pajé do PT no TRF-4 seria uma "farsa juducial", urdida com o deliberado propósito de retirar o réu da disputa presidencial.

Ecoando acriticamente o discurso do petismo, a Fenaj escreveu: "O julgamento do ex-presidente, a ser feito pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, na próxima quarta-feira, vai entrar para a história do Brasil sob duas hipóteses: ou como farsa judicial ou como restabelecimento do Estado Democrático de Direito, abalado pelo golpe [leia-se impeachmente de Dilma Rousseff]. Diante da importância desse fato, a Federação Nacional dos Jornalistas vem a público defender a democracia e o Estado Democrático de Direito."

Para a Fenaj, já vigora no Brasil um "Estado de Exceção". A entidade enxerga na deposição de Dilma pelo Legislativo e na sentença de nove anos e meio de cadeia que Sergio Moro impôs a Lula uma reedição dos "julgamentos farsescos" realizados durante a ditadura militar para "condenar opositores." Diz o texto: "Nesse novo golpe, o Judiciário tem sido suporte para ações nitidamente políticas, como a própria deposição da presidenta Dilma e a condenação, sem provas, em primeira instância, do ex-presidente Lula."

Não há no documento da entidade dos jornalistas uma mísera referência à corrupção endêmica que carcome a máquina estatal brasileira desde o mensalão. Nenhuma palavra sobre o assalto à Petrobras e a outras arcas públicas. Nem sinal de referências à ausência de explicações para os confortos de Lula, a conversão do ex-operário em milionário, suas relações promíscuas com empreiteiras confessadamente corruptas, as revelações constrangedoras feitas por companheiros como Antonio Palocci. Nada!

A Fenaj se espanta cada vez menos. Tornou-se uma entidade de pouquíssimos espantos. Se esfregarem no nariz dos seus dirigentes escândalos em série, nenhum deles fará a concessão de uma surpresa. É assalto? Pois que tenha proporções amazômicas. Com a anuência do Judiciário. E a complacência dos jornalistas, convidados pela entidade a "atuarem na cobertura do julgamento com a necessária ética e responsabilidade profissional." Roga-se à imprensa, com outras palavras, que pare de imprensar.

Numa evidência adicional de que o absurdo adquiriu para a Fenaj uma doce e persuasiva naturalidade, o texto compara o drama penal de Lula, processado por grossa ladroagem, à saga de personagens como Nelson Mandela. Um responde a nove processos criminais por corrupção, lavagem de dinheiro e obstrução à Justiça. Outro foi enjaulado por combater a segregação racial.

Espantosa época a atual, em que uma entidade jornalística abdica dos fatos. Se Deus intimasse os sindicalistas da Fenaj a optar entre o jornalismo e o adesismo, ouviria uma resposta fulminante: "Morra o jornalismo!"

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.