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Até Dirceu já questiona probidade dos Bolsonaro

Josias de Souza

12/12/2018 20h24

Condenado a 41 anos de cadeia em dois processos da Lava Jato, José Dirceu sente-se à vontade para colocar em dúvida a idoneidade da família Bolsonaro. "Em matéria de corrupção, temos que esperar para ver o que vai acontecer com o Bolsonaro e os filhos dele. Eles não têm mais nenhuma autoridade para falar sobre isso", declarou o ex-chefão da Casa Civil de Lula, numa alusão ao caso Coaf.

A declaração de Dirceu foi feita numa entrevista à BBC. O entrevistador recordou que Bolsonaro virou presidente cavalgando um discurso que associa o PT à corrupção. Indagou: A presença ativa de quadros do PT que foram condenados por corrupção, como o senhor, não fortalece a posição dele? E Dirceu, categórico: "De jeito nenhum, senão o Lula não teria levado o [Fernando] Haddad, com 30 milhões de votos, para o segundo turno. A figura mais injustamente acusada é o Lula, não sou eu."

O repórter insistiu: Mas Haddad perdeu para um candidato com um altíssimo índice de rejeição. Dirceu não deu o braço a torcer: "Isso não quer dizer nada. Os dois tinham índice de rejeição parecido. Ele perdeu por outras razões, não só por causa da questão da corrupção."

Foi nesse ponto que Dirceu emendou a frase que evoca o caso da movimentação bancária atípica de R$ 1,2 milhão de Fabrício Queiroz, o ex-motorista de Flávio Bolsonaro. O condenado petista absteve-se de mencionar nomes. Tampouco citou o repasse de R$ 24 mil do ex-assessor do filho mais velho de Jair Bolsonaro para a futura primeira-dama Michelle Bolsonaro.

Dirceu limitou-se a sapatear sobre a demora dos Bolsonaro em acomodar o episódio em pratos limpos: "Não que sejam culpados, precisa investigar. Mas o comportamento já revela algo quase inacreditável." De resto, avaliou que o êxito de Bolsonaro não pode ser associado apenas à pregação anticorrupção. "A vitória dele se explica também pela questão da segurança, da violência, a questão religiosa, das igrejas evangélicas, do kit gay, a questão do antissistema."

A exemplo de Lula, Dirceu já carrega sobre os ombros condenação de segunda instância, pois o TRF-4 confirmou veredictos do então juiz Sergio Moro. Conforme a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, ele deveria estar atrás das grades. Entretanto, foi solto há seis meses, por ordem da Segunda Turma da Suprema Corte. Num processo relatado pelo ministro Dias Toffoli, ex-assessor de Dirceu na Casa Civil, decidiu-se que ele deve aguardar em liberdade pelo julgamento dos recursos que interpôs contra as condenações..

Por ironia, Dirceu recebeu o repórter da BBC em Curitiba, cidade-sede da Lava Jato. Estava num ambiente bem distinto dos cárceres que conheceu no Paraná —um luxuoso condomínio, assentado em área contígua ao parque Tingui. Após percorrer 19 capitais lançando o livro de memórias que escreveu na cadeia, Dirceu desfruta do ócio propiciado por sua liberdade suprema hospedado em casa de amigos.

Dirceu continua fazendo pose de inocente. No seu caso, todas os órgãos públicos de controle e instituições judiciárias do país erraram. Da Procuradoria à Justiça, da Receita à Polícia Federal, todos contribuíram para a condenação de um "inocente". No caso dos Bolsonaro, porém, Dirceu avalia que um relatório do Coaf já permite concluir que "eles não têm mais nenhuma autoridade" para falar sobre corrupção. Nada como a palavra de um especialista no assunto.

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Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.


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