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Josias de Souza

Para petistas, Dilma vai ter de socorrer Haddad, sob pena de pagar o preço da ingratidão a Lula

Josias de Souza

16/03/2012 16h57

Dissemina-se entre os petistas uma pregação tóxica. Diz-se que Dilma Rousseff ficará mal na foto se não pagar na eleição municipal de São Paulo parte de sua dívida de gratidão com Lula, que a transformou de poste em presidente.

Com 3% no Datafolha e zero no placar das coligações, Fernando Haddad corre atrás de alianças que lhe permitam ampliar a vitrine eletrônica. Por ora, não dispõe senão dos 4min30s do PT.

O petismo joga suas principais fichas no PR, dono de quase três minutos de tempo de tevê. Em São Paulo, a aliança passa por um deputado federal que é sinônimo de encrenca: Valdemar Costa Neto. Em Brasília, passa pela mesa de Dilma.

A despeito do nariz torcido da presidente, o PT acredita que, na hora em que ficar claro que a onça precisa beber água, Dilma vai ceder. Um petista que faz política no Nordeste observa a moldura e pinta o quadro:

"Creio que a Dilma vai se sensibilizar. Ela conversa muito com Lula. E pode ficar numa situação difícil. As pessoas vão perguntar: Lula fez tudo por ela e agora, numa hora em que ele está doente, ela não vai fazer nada por ele?"

Nessa versão, a eventual vitória de José Serra, o antagonista tucano de Haddad, será uma derrota pessoal de Lula. E Dilma vai virar sócia do infortúnio "se as pessoas comecarem a dizer que ela se recusou a ajudar".

Dá-se de barato que o Lula pós-câncer na laringe não será o Lula de 2010. Ainda que se recupere, não levará aos palanques de Haddad a mesma energia que levou à campanha de Dilma. Até por isso, diz o petista nordestino, "ela não tem como abandonar o cara".

O PR condiciona a coligação com Haddad à reconquista do Ministério dos Transportes. A resistência de Dilma já havia aproximado o partido da mesa de negociações do candidato de Michel Temer à prefeitura paulistana, Gabriel Chalita (PMDB).

Ao transformar resistência em aversão, Dilma inspirou dois novos movimentos: em Brasília, a bancada de sete senadores do PT declarou-se rompida com o governo. Em São Paulo, o PR abriu conversações também com o tucanato de Serra.

Em privado, Dilma chama os arroubos do PT pelo nome próprio: "chantagem". Devolvendo os Transportes à legenda do ex-ministro Alfredo 'A Careca do Serra é Linda' Nascimento, a presidente torna-se refém.

O PT aposta numa saída alternativa que leve o PR à Esplanada noutra pasta que não seja a dos Transportes. Por enquanto, Dilma condiciona a retomada do diálogo à reconsideração da declaração de rompimento da tropa do capitão Nascimento.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.