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Josias de Souza

Recife: Eduardo Campos convida o PSDB para compor coligação do PSB e Aécio opera contra

Josias de Souza

30/06/2012 04h25

A campanha municipal de Recife ganhou um contorno definitivamente nacional. Após declarar guerra ao PT local, o governador Eduardo Campos, cultor de um cada vez mais explícito projeto presidencial, achegou-se ainda mais às legendas que representam a oposição em Pernambuco e no plano federal.

Eduardo já recepcionou o PMDB do senador Jarbas Vasconcelos na coligação de Geraldo Júlio, o candidato tardio do seu PSB à prefeitura. Na noite passada, o governador convidou os oposicionistas PSDB e PPS a incorporar-se à caravana antipetista de Recife.

Em Pernambuco, o PSDB é comandado por seu presidente nacional, o deputado Sérgio Guerra. Eduardo vinha trocando telefonemas com ele. Na noite passada, recebeu-o no Palácio do Campo das Princesas, sede do governo pernambucano. Nessa conversa, formalizou a proposta de aliança.

Candidato à Presidência da República pelo PSDB, o senador Aécio Neves (MG) farejou, à distância, o cheiro de queimado. Em contatos com Sérgio Guerra, instou-o a associar o tucanato com o candidato a prefeito do DEM, o deputado Mendonça Filho, confirmado em convenção realizada nesta sexta (29). O senador Jose Agripino Maia (RN), presidente do DEM federal, ecoou Aécio junto a Sérgio Guerra.

Antes de trocar ideias com o mandachuva dos tucanos, Eduardo Campos recebera em palácio, ainda na noite passada, o ex-deputado Raul Jungmann, que preside no Estado o proto-oposicionista PPS. Instou-o a também cerrar fileiras na trincheira do PSB.

Enquanto Eduardo tricotava com os ex-adversários, o ex-aliado PT ratificava, em evento transmitido ao vivo pela internet, a candidatura do senador Humberto Costa. Rui Falcão, o presidente do PT federal, anunciou à militância presente ao ato a grande novidade da noite: o vice na chapa de Humberto será o deputado João Paulo, um popularíssimo ex-prefeito de Recife.

João Paulo comandou a prefeitura por dois mandatos (2001-2008). Concluiu o ciclo com altos índices de aprovação. A popularidade permitiu-lhe eleger como sucessor um companheiro João da Costa, que se revelaria um gestor insosso. Passada a eleição, brigaram. O desentendimento produziu o isolamento do prefeito.

João da Costa apartou-se de tal forma do comando do PT que, em movimento avalizado por Lula, o partido sonegou ao seu prefeito o direito de disputar a reeleição. A cúpula nacional impôs Humberto, o outro Costa. A divisão petista serviu de pretexto para o rompimento de Eduardo, que cunhou uma frase de efeito: "Podem me pedir tudo, menos para perder."

Os últimos chuleios da custura antipetista de Eduardo Campos ocorreram horas antes do término do prazo para que os partidos realizem suas convenções. Pela lei, as legendas que quiserem apresentar candidatos precisam fazê-lo até este sábado (30).

O tucano Sérgio Guerra empina desde o início do ano a candidatura de Daniel Coelho, um jovem deputado estadual que o PSDB importou do PV. A conversa com Eduardo sobre a aliança com o PSB e os apelos de Aécio pelo acerto com o DEM emprestaram à opção própria dos tucanos a consistência de um pote de gelatina.

Pelo PPS, o próprio Raul Jungmann apresentava-se como candidato. Isolado, sem dinheiro e com estrutura precária, ele já informou ao partido que abdicou de suas pretensões. Defendia que a oposição se unificasse em torno de Raul Henry, um pupilo de Jarbas Vasconcelos que se apresentava como postulante do PMDB.

Essa alternativa ruiu na semana passada, quando o PMDB de Jarbas aderiu a Geraldo Júlio (PSB), o candidato do ex-desafeto Eduardo. A hipótese de empurrar o PPS para dentro da coligação do DEM não agrada a Jungmann. Restam-lhe duas opções: o apoio ao tucano Daniel Coelho ou a adesão ao candidato fabricado pelo governador.

Entre o PSDB e o PSB, Jungmann prefere a premeira alternativa. Vislumbra a hipótese de indicar o vice do neotucano Daniel Coelho. Algo que só poderá ocorrer se Sérgio Guerra resistir à sedução de Eduardo e aos apelos de Aécio. A convenção dos tucanos está marcada para hoje. Portanto, vai-se descobrir nas próximas horas que apito o presidente do PSDB decidiu tocar.

De concreto, por ora, apenas uma evidência: a movimentação de Eduardo Campos deixou o petismo indignado e a oposição perplexa. Ao romper com o PT, o governador pôs em risco o projeto do ex-aliado de manter-se no comando da prefeitura. E subtraiu dos ex-adversários o discurso de oposição.

Produziu-se uma polarização instantânea. De um lado, a trincada tropa do PT. Na trincheira oposta, o exército do PSB, adensado por 15 das 16 legendas que apoiavam a prefeitura petista de João da Costa e mais o PMDB.

Nas conversas com Sérgio Guerra e Raul Jungmann, Eduardo Campos deixou claro que não atravessou o Rubicão a passeio. Deseja ter toda a oposição do seu lado, exceto o DEM de Mendonça Filho, para tentar liquidar o PT já no primeiro turno. Ficou entendido que, se não for possível, conta com as adesões no segundo round.

Não são despropositadas, como se vê, as preocupações de Aécio. Se prevalecer sobre o PT na cidadela de Recife, Eduardo Campos vai às manchetes como opção do condomínio hoje reunido em torno de Dilma Rousseff para a sucessão de 2014. Ganhando com o apoio da oposição, ainda que no segundo turno, sinalizará para os rivais do PT que está aberto a composições múltiplas.

Tudo isso sem romper com o amigo Lula, com quem dividiu sorrisos numa reunião-almoço realizada na quinta-feira (28), em São Paulo. Ao discursar no ato em que formou com João Paulo uma 'superchapa' para enfrentar o PSB, Humberto Costa insinuou que Eduardo Campos carrega um poste.

Geraldo Júlio é um técnico. Antes de ser empurrado para o palanque, respondia pela Secretaria de Desenvolvimento Econômico do Estado. Jamais enfrentou o teste das urnas. 
"Aqui não é concurso público", ironizou o candidato do PT. "É preciso ter história." Por um instante, o senador esqueceu que Eduardo apenas mimetiza em 2012 o Lula de 2010. O que era Dilma senão uma técnica sem biografia política?

Humberto absteve-se de recordar também que Lula tenta repetir o feito nacional na praça de São Paulo, onde derrama suor num esforço para eletrificar o poste Fernando Haddad, um candidato de mostruário a qualquer "concurso público".

A diferença é que, na cena paulistana, Lula "morde o calcanhar" do tucano José Serra com o conveniente apoio do PSB de Eduardo Campos. O mesmo Eduardo que, na seara pernambucana, busca uma parceria com o tucanato e Cia. para mastigar o calcanhar do PT.

Atualização feita às 19h17 deste sábado (30): O PSDB optou por confirmar Daniel Coelho como seu candidato. O PPS de Raul Jungmann indicou a candidata a vice na chapa tucana: a socióloga Débora Albuquerque.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.