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Josias de Souza

Aécio: ‘Um estágio na oposição faria bem ao PT’

Josias de Souza

29/09/2012 03h19

Aécio Neves realizou durante a semana um road show pelo Nordeste. De passagem por Recife, jantou no apartamento do presidente do PSDB federal, o deputado pernambucano Sérgio Guerra. Enquanto sorvia vinho branco, entregou-se a análises sobre a conjuntura política. Falou de PT, de Lula, da própria candidatura e da novidade Eduardo Campos.

Filmado por uma equipe de entrevistadores do diário Folha de Pernambuco, Aécio soou irônico ao discorrer sobre o PT. Disse que "um estágio na oposição faria bem" à legenda de Lula, no poder federal há nove anos e nove meses. "Eu vou trabalhar muito para permitir ao PT reencontrar-se com sua história, [ficando] na oposição um período".

O presidenciável tucano fez troça da nota articulada pelo presidente do PT, Rui Falcão. Endossado por outras cinco legendas governistas, o texto tachou de "golpismo" a intenção do PSDB, do DEM e do PPS de requerer à Procuradoria da República investigações sobre o envolvimento de Lula no mensalão.

"A nota beira o ridículo", bicou Aécio. "É uma coisa nova. […] Nunca antes na história do Brasil nós vimos um partido recear e alertar o Brasil sobre a possibilidade da deposição de um ex-presidente da República." Disse ter ouvido de "petistas ilustres" palavras de preocupação com a "guinada" da legenda, hoje rendida à tese segundo a qual "pelo poder vale qualquer coisa". Absteve-se de declinar os nomes. "Por delicadeza, não devo citar."

A certa altura, Aécio evocou ataques feitos por Lula ao tucano Arthur Virgílio, ao 'demo' ACM Neto e ao antecessor FHC em comícios de Manaus, Salvador e Belo Horizonte. Criticou: "Ele está deixando de se comportar como ex-presidente da República de todos os brasileiros. Está optando pelo papel de líder de facção. Não é bom para a história dele."

Fez uma declaração de apreço ao ex-soberano: "Eu era acusado no PSDB de ser amigo demais do Lula. O Lula era meu companheiro de jogar bola. Era o lateral esquerda do meu time, que de vez em quando a gente botava pra jogar, antes de ele ser presidente da República. Eu gosto pessoalmente do Lula. Mas acho que, nesse momento, ele poderia estar agindo como ex-presidente da República…"

Era noite de quinta-feira (27). Aécio não suspeitava. Mas em São Paulo, em palanque dividido com Lula, o candidato petista Fernando Haddad também o alfinetava: "Se o Aécio quer ser presidente, estude um pouquinho, leia um livro por semana. Pode ser na praia de Ipanema." O alvo de de Haddad tomaria conhecimento dos dardos de Haddad na manhã seguinte.

Numa escala em Maceió, repisou a crítica a Lula –"líder de facção"— e levou Haddad à alça de mira. Mas foi em Salvador, após ruminar durante horas o conselho para que leia livros nas areias de Ipanema, que o presidenciável mineiro decidiu pegar pesado. Chamou Haddad de "idiota".

"Quero agradecer ao candidato Haddad por ter lançado a minha candidatura, mas vou deixar que o meu partido decida isso no tempo certo. Como não acho que ele possa ser tão idiota como parece às vezes, certamente ele quis dar ali uma estocada no presidente Lula, talvez não satisfeito com a incapacidade que [Lula] demonstrou até agora para alavancar sua candidatura."

Além de chamar o detrator de "idiota", Aécio associou-se a outro adjetivo: incompetente. Disse que a gestão de Haddad na pasta da Educação foi "desastrosa". Foi ao calcanhar: "O Enem talvez seja a moldura para mostrar a incompetência que foi a sua gestão."

Aécio insinuou que, passada a eleição de 7 de outubro, Haddad disporá de muito tempo livre. Mimetizando o apadrinhado de Lula, sugeriu o desperdício desse tempo com a leitura. Foi específico: "Até vou sugerir a ele, nas férias forçadas que provavelmente terá a partir de domingo, que ele inicie lendo a biografia de São Francisco de Assis. Um pouco de humildade, se não fizer bem ao homem público, cuja carreira caminha para terminar de forma precoce, fará dele uma pessoa melhor no futuro."

No repasto servido por Sérgio Guerra, Aécio dissera meia dúzia de palavras sobre o projeto presidencial que Haddad ridicularizava em São Paulo. "Tenho dito que o PSDB não pode ter agora um candidato a presidente da Republica. Seria um atropelo, por o carro na frente dos bois." Ás portas do ano pré-eleitoral de 2013, continua dizendo coisas assim: "Agora nós temos que construir um discuso." Algo que sinalize "o que o PSDB representa, diferente do que está aí, o que nós faríamos diferente."

Aécio foi a Recife para participar de caminhada ao lado do candidato do partido à prefeitura local, o ascendente Daniel Coelho, hoje vice-líder das pesquisas. Elogiou-o a mais não poder. "Independentemente do resultado da eleição, já é um vitorioso. Ele é a renovação que o PSDB precisa…" Reconheceu: "Eu não vim aqui trazer nenhum voto, que eu não tenho. Vim dizer que o PSDB está muito contente com a campanha que ele está fazendo."

Curiosamente, apresentou-se na mesma conversa como "amigo" do governador pernambucano Eduardo Campos, que se dedica nos últimos dias a atacar Daniel Coelho e vice-versa. Perguntou-se a Aécio sobre o desejo não declarado de ter o mandachuva do PSB como vice de uma chapa tucana em 2014.

E ele, cheio de dedos: Em vários Estados há uma proximidade natural [entre PSDB e PSB]. E as coisas naturais, na política, são aquelas que funcionam. Mas o Eduardo é hoje uma liderança importantíssima, das mais relevantes do Brasil, que atua do lado do governo. Já deu várias declarações de que pretende estar ao lado da presidente Dilma. Eu vou respeitar essa opção. Vou continuar sendo seu amigo, se essa for a opção dele."

Prosseguiu: "Se você me perguntar se eu gostaria de construir no futuro, seja lá como for, um projeto mais próximo… [Ambos vão estar juntos?, ouve-se na fita, ao fundo] Não posso dizer isso porque ele tem hoje uma posição clara de que participa da aliança que governa o Brasil. Eu sou oposição a essa aliança. Nós temos sinergias estaduais, o que é relevante. Só ele é que vai poder dizer se, no futuro, vai deslocar-se pro nosso campo. Nao sei… O que eu posso dizer é que não vou aderir ao governo. Vou continuar na oposição. Pro brasil esse contraponto é muito importante. O brasil nao pode virar um México com o PRI, um partido único."

E quanto ao crescimento do PSB, mete medo? "Ao contrário. Acho até muito legítimo que PSB possa lançar um candidato [à Presidência]. Mas nesse momento não seria de oposição. Quanto mais plural for a disputa melhor. Não podemos ficar analisando o que os outros vão fazer. Nós temos que decidir o que vamos fazer…"

Em guerra com o PT de Pernambuco e na bica de fazer do seu 'ex-poste' Geraldo Julio o próximo prefeito de Recife, o "amigo" Eduardo Campos está mais para antagonista de Aécio do que para vice dele. Em privado, o próprio FHC elogia-lhe a desenvoltura.

Três dificuldades separam o governador do voo nacional. Primeiro, o cordão umbilical que o liga a Lula. Segundo, a popularidade exuberante que exibe dilma Rousseff. Depois, a inanição de votos fora do Nordeste. Nesse ponto, seu drama é inverso ao de Aécio, mais conhecido no Sudeste e um zero à esquerda entre os nordestinos.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.