Topo

Josias de Souza

Grampo revela interesse da quadrilha de Paulo Vieira e Rosemary no julgamento do mensalão

Josias de Souza

14/12/2012 22h25

Nem só de pareceres de órgãos públicos e de tráfico de interesses privados vivia a quadrilha desbaratada na Operação Porto Seguro. Diálogos telefônicos captados pela Polícia Federal indicam que Paulo Vieira, o "chefe" do grupo, e sua protetora Rosemary Noronha, a Rose, interessavam-se também pelo julgamento do mensalão no STF.

A novidade foi esmiuçada em notícia levada à web pela revista Época. O texto faz menção a um grampo no qual soam as vozes de Paulo, o diretor afastado da Agência Nacional de Águas, e de Rose, a chefe exonerada do gabinete da Presidência em São Paulo.

A conversa ocorreu em 12 de novembro. Começou às 9h47. Durou 11 minutos. Naquele dia, os ministros do STF discutiam a dosimetria das penas dos condenados do PT: José Dirceu, José Genoino e Delúbio Soares. A certa altura, Paulo Vieira pede a Rose que obtenha o assentimento de Dirceu para uma articulação que ele urdia nos subterrâneos de Brasília.

"Eu vou protocolar amanhã ou quarta aquela outra questão que eu queria que você mostrasse para o JD [José Dirceu]. Você lembra qual é, né?" Rose lembrava. Paulo Vieira tricotava com o deputado Valdemar Costa Neto (PR-SP), também condenado no mensalão, e com o ex-senador Gilberto Miranda.

De acordo com a revista, a tróica movia-se para pressionar ministros do STF. Tentava-se atenuar as penas dos mensaleiros ou conquistar a simpatia dos magistrados para futuros recursos. Tramava-se, de resto, nomear um juiz companheiro para a vaga de Carlos Ayres Britto, que se aposentou. Tudo isso, contando com a proximidade de Rose com Lula e Dirceu.

Considerando-se o tamanho das penas fixadas pela maioria dos ministros do STF, a quadrilha não logrou atingir os seus objetivos. Mas a conversa de timbre vadio travada entre Paulo Vieira e Rose dá ideia do que se passava em certos gabinetes da República. "Não sei se o JD está com cabeça para mexer com essas coisas", diz Paulo Vieira.

E Rose, como a tranquilizá-lo: "Eu vou viajar com ele [Dirceu] no feriado. Nós vamos para a Bahia. Eu converso bastante com ele. […] Ele não pode ficar preso dentro de casa, né. A vida corre. Eu falo com ele. Eu tive com ele no feriado, eu falo com ele."

Paulo parece preocupar-se com Dirceu. "Como é que ele está, Rose?" Ela responde: "Está bastante chateado. Estão preparando umas coisas. […] É o Gilberto Miranda que está ajudando ele. Estão fazendo várias reuniões na casa dele." Paulo revela certa familiaridade com o tema. "Isso eu tenho mais ou menos ideia do que eles estão falando."

Rose prossegue: "Ele [Dirceu] me disse… A mulher dele [de Dirceu, Evanise Santos] disse que eles têm reunião lá na casa dele [Gilberto Miranda]." E Paulo: "O Gilberto Miranda é muito bem [sic] para articular, viu? […] Eu não sabia que eles estavam apostando tantas fichas dessa questão, tá". Rose confirma: "Parece que tão."

A alturas tantas, Paulo Vieira enfia Deus na conversa. Segundo a PF, trata-se de Lula, não do Padre Eterno. "Eu não sabia que o JD [Dirceu] tava dando esse peso todo para o Giba [Gilberto Miranda], não. Mas eu continuo apostando que o melhor peso que tem é o… Deus, viu?"

Bem informada sobre as intenções de Lula, Rose desdenha da hipótese do socorro divino. "É, mas ele não vai fazer absolutamente nada." Paulo perscruta: "Você está achando que Deus não está a fim de…" E Rose, atalhando-o: "Não! Eu acho que não está a fim, não." Paulo soa compreensivo: "É, às vezes ele tem medo de arrumar confusão, né, Rose?"
 Curiosamente, o interlocutor da ex-super-auxiliar de Lula troca a loquacidade pelo recato. Recorda a Rose  que não convém "falar essas coisas por telefone". É, faz sentido.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.