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Josias de Souza

PSDB e PT viraram cabos eleitorais de Marina

Josias de Souza

11/08/2013 06h36

Antes de a rapaziada encher as ruas, o PSDB de Aécio Neves e o PSB de Eduardo Campos enxergavam em Marina Silva uma bela alternativa de vice. Hoje, se Aécio e Eduardo se oferecessem para vice de uma chapa encabeçada por Marina, ela talvez desdenhasse. O último Datafolha confirmou o que as pesquisas anteriores já haviam insinuado: Marina tornou-se uma presidenciável mais competitiva do que os outros adversários de Dilma Rousseff.

Para se consolidar na segunda posição, Marina recebe a ajuda de dois cabos eleitorais inesperados: PSDB e PT. Metidos numa gincana para ver quem joga mais lama no outro, tucanos e petistas levam parte do eleitorado irritado com os políticos a ver em Marina uma espécie de heroína da resistência. A imagem é fantasiosa. Mas, em tempos de mensalão e de Siemens, um pedaço da plateia parece preferir o improvável a ter que optar entre o lamentável e o impensável.

De acordo com o Datafolha, Dilma recuperou um naco do prejuízo que contabilizara nas pegadas dos protestos de junho. Evoluiu de 30% para 35%. Marina engordou de 23% para 26%. Aécio foi lipoaspirado de 17% para 13%. E Eduardo manteve praticamente o mesmo peso, oscilando de 7% para 8%. Nesse cenário, se a eleição fosse hoje, Marina disputaria a poltrona de presidente da República num segundo turno contra Dilma.

Os mais céticos duvidam dessa possibilidade sob o argumento de que falta a Marina estrutura política. Numa fase em que a garotada grita na rua que "o povo unido não precisa de partido", ter estrutura pode ser desvantajoso. Marina é a candidata do paradoxo. Até aqui, cresceu sem cargos, sem partido e sem o espaço generoso que seus contendores recebem dos meios de comunicação. Enquanto tenta colocar em pé a sua # Rede, Marina surfa numa onda que engolfa todos os conceitos, revirando-os.

Na noite de sexta-feira, discursando para militantes petistas em Bauru, Lula disse que o PT "não tem medo de conversar com o povo na rua." O que o partido precisa temer, ele acrescentou, são "aqueles que começam a negar a política." Chamou de "analfabetos" os jovens que dizem "eu não gosto de política, não gosto de nenhum partido político, não gosto de sindicato."

Lula lecionou: "Temos que dizer, alto e bom som: fora da política não tem saída. Se a gente quiser pegar dois exemplos, a gente pega Hitler e Mussolini." Tolice. As ruas pedem respeito e decência, não nazismo e fascismo. Há cadáveres demais no noticiário. Insepultos, produzem um fedor lancinante. Não bastasse a insatisfação generalizada com a precariedade dos serviços públicos, desapareceu da cena política brasileira a presunção de superioridade moral. As legendas que polarizam a disputa integraram-se à perversão comum a todas as siglas. É nessa onda que Marina surfa.

O excesso de lodo potencializa a subversão dos conceitos. Eleição vira loteria sem prêmio. Voto transforma-se num equívoco renovado a cada quatro anos. Partidos convertem-se em organizações com fins lucrativos. Coligações viram conchavos entre culpados inocentes e inocentes culpados. Democracia passa a ser um regime que saiu pelo ladrão.

O PSDB já carregava nas costas Eduardo Azeredo e o mensalão de Minas, ainda pendente de julgamento no STF. Com a delação da Simens, a legenda presidida por Aécio Neves foi empurrada para uma defensiva que tende a perdurar até 2014. O PT optou por acalentar os seus mensaleiros. Com isso, amarrou a sua sorte ao julgamento do escândalo.

Se os condenados forem para a cadeia, a legenda será presa com eles. Se o STF revogar as condenações por formação de quadrilha, livrando José Dirceu e Cia. da cana dura, as ruas brasileiras podem ficar pequenas para tanta gente. Nessa hipótese, convém dedicar atenção redobrada a Marina Silva. Em 2010, ela arrastou 19 milhões de votos e empurrou o tucano José Serra para o segundo turno. Agora, aproxima-se dos 30% de intenções de voto dizendo coisas definitivas sem definir muito bem as coisas.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.