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Josias de Souza

Levy dá preconceito como bananeira dá bananas

Josias de Souza

29/09/2014 09h59

O ser humano se espanta cada vez menos. Tornou-se uma criatura de pouquíssimos espantos. Se testemunhar um homem dando à luz uma aberração, não fará a concessão de uma surpresa.

Na noite passada, durante o debate de presidenciáveis transmitido pela Record, o nanico Levy Fidelix deu preconceito diante das câmeras como a bananeira dá bananas. A plateia riu. E os demais candidatos silenciaram.

Alguém que ainda não suprimiu dos seus hábitos o ponto de exclamação precisa mover uma ação judicial contra o nanico Levy. Ele cometeu sob holofotes pelo menos dois crimes: homofobia e incitação à violência.

Luciana Genro perguntou-lhe "por que as pessoas que defendem tanto a família se recusam a reconhecer como família um casal do mesmo sexo?" E Levy deu preconceito em cacho.

"Olha, minha filha, tenho 62 anos. Pelo que vi na vida, dois iguais não fazem filho." Ouviram-se risos. "E digo mais: desculpe, mas aparelho excretor não reproduz". Mais risos. "É feio dizer isso, mas não podemos, jamais, gente —eu, que sou um pai de família, um avô—, deixar que tenhamos esses que aí estão, achacando a gente no dia a dia, querendo escorar essa minoria… a maioria é do povo brasileiro."

Levy não parava de excretar: "Prefiro não ter esses votos, mas ser um pai, um avô que tem vergonha na cara, que instrua seu filho, que instrua seu neto. E vamos acabar com essa historinha: eu vi agora, o santo padre, o papa expurgar do Vaticano um pedófilo. Está certo. Nós tratamos a vida toda com a religiosidade, para que nossos filhos possam encontrar um bom caminho familiar."

Mais babanas: "Então, lamento muito. Que façam bom proveito os que querem continuar como estão. Mas eu, presidente da República, não vou estimular. Se está na lei, que fique como está. Mas estimular, jamais, a união homoafetiva."

Sem perceber que debatia com um homem-bananeira, Luciana Genro deu trela à aberração: "Infelizmente, não está na lei. O casamento civil igualitário é fundamental para que nós possamos reconhecer juridicamente qualquer tipo de família. Creio que sou uma das que mais defendem a família, porque estou defendendo todas as famílias. Não importa que sejam dois homens e duas mulheres. O que importa é que as pessoas se amem. Para combater a discriminação, é fundamental reconhecer o casamento civil igualitário."

Ao perceber que seu preconceito provocava risos e reações amenas, Levy animou-se. Querem bananas? Pois que seja em profusão! "O Brasil tem 200 milhões de habitantes. Se começarmos a estimular isso aí, daqui a pouquinho vai reduzir para 100 milhões. …Então, gente, vamos ter coragem: nós somos maioria. Vamos enfrentar essa minoria! Vamos enfrentá-los, não ter medo de dizer que sou pai, mamãe, vovô… E o mais importante é que esses que têm esses problemas sejam atendidos no plano psicológico e afetivo. Mas bem longe da gente. Bem longe mesmo…"

Quando alguém testemunha um cristão como Levy Fidelix dando preconceitos em cacho, fica tentado a concluir que Deus não merece existir.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.