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Josias de Souza

Partidos registram 31 candidatas-laranja em MG

Josias de Souza

22/10/2014 18h47

Em Minas Gerais, a Procuradoria Regional Eleitoral decidiu investigar um flagelo cada vez mais comum nas eleições brasileiras: o lançamento de falsas candidaturas femininas. No funk carioca, espera-se das mulheres-fruta exuberância anatômica e presença de espírito. Na política, exige-se das candidatas-laranja apenas a ausência de corpo. Elas são registradas não para fazer campanha, mas para simular o cumprimento da cota de gênero prevista na legislação eleitoral.

Foram identificadas em Minas Gerais 31 candidatas que tomaram chá de sumiço na campanha. Ouvidas, 22 disseram que nem mesmo sabiam que seus nomes e dados pessoais tinham sido usados pelos partidos. Noutros nove casos, as assinaturas rabiscadas nos pedidos de registro de candidatura não batem com as rubricas das donas. A Procuradoria farejou na anomalia um odor de falsidade ideológica. Trata-se de crime. Sujeita o autor a 5 anos de cadeia.

Aprovada em 1997, sob o número 9.504, a Lei Eleitoral anota no parágrafo 3º do artigo 10 que, nas eleições proporcionais, todos os partidos políticos têm de lançar uma cota mínima (30%) e máxima (70%) de candidaturas de cada sexo. Como a política é uma atividade majoritariamente masculina, as legendas passaram a conviver com a obrigatoriedade de reservar 30% de suas candidaturas às saias.

Em vez de procurar mulheres vocacionadas para a atividade político-partidária, várias legendas preferiram burlar a lei, lançando candidatas-laranja. Dessa forma, além de simular respeito à legislação,  evita-se submeter os políticos do sexo masculino ao inconveniente da concorrência. Para desassossego dos espertos, Patrick Salgado, procurador regional eleitoral em Minas Gerais, decidiu lançar uma lupa sobre a fuzarca.

O procurador realça o óbvio: partidos que falseiam o registro de candidaturas cometem crime. E seus dirigentes sujeitam-se a virar réus em ações criminais. Mulheres que cedem voluntariamente assinaturas e dados para a formalização de candidaturas-laranja arriscam-se a frequentar os processos na posição de coautoras da fraude.

"As mulheres irregularmente inscritas pelos partidos, como qualquer candidato, ficam obrigadas a prestar contas da campanha eleitoral", afirma Patrick Salgado. "A não prestação de contas pode resultar, posteriormente, na falta de quitação eleitoral e em outras consequências decorrentes dessa situação".
 Os 31 casos já identificados em Minas foram encaminhados a promotores eleitorais, para o oferecimento de denúncias ao Judiciário.

Bons tempos aqueles em que mulher era apenas o ser mais bem-acabado do gênero humano e laranja não passava de uma fruta.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.