TV Câmara exibiu uma divertida programação
Normalmente, o plenário da Câmara costuma produzir cenas de televisão que, quando as pessoas ligam, não conseguem mais desligar —dormem instantaneamente. Porém, sucedeu algo diferente nesta terça-feira. Transmitido pela TV Câmara, o debate sobre o ajuste fiscal de Dilma Rousseff, também conhecido como arrocho trabalhista, resultou numa divertida programação. Houve um pouco de tudo —de manifestantes mudos da CUT a brigas típicas de pátio de colégio. Para arrematar, um panelaço.
Houve também uma chuva de dólares cenográficos sobre a bancada de deputados petistas. Sindicalistas da Força Sindical lançaram sobre o plenário centenas de notas falsas do que chamaram de "PTro Dollar". No centro das cédulas, fotos de Lula, Dilma e João Vaccari Neto, o ex-tesoureiro do PT, preso em Curitiba. O papelório foi despejado depois que um discurso do líder tucano Carlos Sampaio incendiou as galerias, despertando uma fagulha que ardia desde o início da sessão.
Sampaio espicaçou os petistas, obrigados a se alinhar à supressão de benefícios trabalhistas. As galerias pegaram fogo depois que o líder tucano chamou os companheiros de Dilma de "caras de pau" e "corruptos". Reunida pelo deputado Paulinho da Força, presidente do Solidariedade, a infataria da Força Sindical soltou a língua. Entre outras coisas, gritou: "Ô Dilma, vai se fodeeeeeer, o Brasil não precisa de vocêêêêê…"
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Submetido aos impropérios e ao temporal que insinuava a presença de deputados vendidos em plenário, o presidente da sessão, Eduardo Cunha, viu-se compelido a mandar esvaziar as galerias. Junto com as dezenas de ruidosos representantes da "Força", determinou que saíssem também meia dúzia de gatos pingados da CUT, braço sindical do PT. Por solidariedade aos petistas, estavam mudos. Limitavam-se a empunhar em silêncio cartolinas com inscrições contrárias ao arrocho de Dilma.
Houve tumulto. E a sessão foi suspensa por 20 minutos. Tempo para que os telespectadores fossem estourar uma pipoca. O mais inusitado estava por vir. O deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), ex-ministro dos Esportes, varrido da Esplanada na pseudofaxina ética do primeiro mandato de Dilma, foi ao microfone para pedir providências a Eduardo Cunha.
Orlando Silva sugeriu ao presidente da Câmara que requisitasse as imagens do circuito interno, para identificar os sindicalistas que fizeram chover "dólares" no plenário. Presidente do PPS, Roberto Freire também foi ao microfone. Recordou uma cena ocorrida há 15 dias, durante a votação do projeto da terceirização. Disse que manifestantes da CUT, então barulhentos, agrediram o deputado Lincoln Portela (PR-MG). Freire lamentou que nenhum petista ou comunista do 'B' tenha se animado a cobrar providências contra os agressores de Lincoln.
Orlando abespinhou-se. De costas para Freire, disse que o apoio do colega aos abusos das galerias envergonham a Câmara. Cutucando o ombro do interlocutor por trás, Freire tentou argumentar. "Não encosta a mão em mim", reagiu Orlando, injetando ares adolescentes na cena. "Olha a minha integridade física". A deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) tomou as dores do colega, interpelando Freire. Depois, reclamou no microfone que fora tocada por ele no braço.
Nesse ponto, o deputado Alberto Fraga (DEM-DF), um dos líderes da bancada da bala, saiu em defesa de Freire. Súbito, pronunciou a seguinte frase: "Na política, mulher que bate duro como homem tem que apanhar como homem." Jandira esperou alguns segundos pela reação de Eduardo Cunha. E nada. "Vai permitir isso?", ela indagou. E Cunha: "Não posso censurar nenhum deputado." Sobreveio um rififi típico de pátio de colégio.
Língua em riste, o deputado Glauber Braga (PSB-RJ) insinuou que processaria Fraga. "A ameaça de qualquer parlamentar não vai me intimidar em 0,01% nas ações contra esse tipo de medida machista, violenta e retrógada. A fama dele no Distrito Federal de matador não vai me intimidar." Fraga refugou a pecha. E bateu: "O que não aceito é a cretinice, a hipocrisia de se fazer de vítima. O povo me elegeu como mais votado por ser firme. E não vai ser um guri que vai me calar."
Seguiu-se um coro de rima pobre, entoado pela bancada feminina da Câmara: "A violência contra a mulher não é o Brasil que a gente quer!" A expressão foi repetida uma, duas, três, quatro, cinco, seis, sete, oito vezes. Vários parlamentares sugeriram a Eduardo Cunha que suspendesse a sessão. Não foram atendidos. Jandira Feghali ainda subiria à tribuna para afirmar que o comentário de Fraga não ficará impune. Seu desafeto chamou-a de "atriz".
Pouco antes, os telespectadores da TV Câmara foram brindados com uma cena de comédia-pastelão. Líder do governo, o deputado José Guimarães (PT-CE) foi cochichar com Eduardo Cunha. Ao debruçar-se sobre a mesa da presidência, esbarrou no copo d'água, quebrando-o. À distância, Chico Alencar (PSOL-RJ) gritou: "Agressão, agressão, agressão." E Cunha, entre risos: "O govero fez um estrago na mesa, quer inundar o Parlamento." Guimarães, meio sem graça, inventou uma simpatia: "Copo quebrado é sinal de vitória."
De fato, o governo prevaleceria pouco depois sobre a oposição. O texto-base da primeira medida provisória do pacote fiscal de Dilma foi aprovado. Parodiando um famoso samba, a oposição puxou um coro: "PT pagou com traição a quem sempre lhe deu a mão…" Minutos depois, materializaram-se no plenário várias panelas. E os oposicionistas promoveram um panelaço no plenário. Batendo no ritmo do samba, retomaram a cantoria: "PT pagou com traição a quem…" Nenhuma emissora ofereceu à audiência programação tão divertida. Tornou-se impossível concorrer com a TV Câmara.
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