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Josias de Souza

Dilma assistiu derrota no STF enquanto deputados festejavam Temer em jantar

Josias de Souza

15/04/2016 05h11

Dilma Rousseff e Michel Temer viveram na noite passada experiências antagônicas. Recolhida ao Palácio da Alvorada, a presidente assistiu, pela televisão, à sessão extraordinária em que o STF sepultou as ações do governo contra a votação do impeachment. "Se houver falta de votos, não há intervenção judicial que salve", ironizou o ministro Gilmar Mendes a certa altura.

Os votos que escasseiam no cesto de Dilma cercavam o vice-presidente da República numa mansão no Lago Sul, bairro chique da Capital. Algo como 80 deputados apertavam a mão, abraçavam, trocavam um dedo de prosa com Temer. Muitos o chamavam de "presidente". Usufruíram de um coquetel seguido de jantar. Tudo oferecido pelo deputado Heráclito Fortes (PSB-PI). Respirava-se no local doce fragrância da perspectiva de poder.

Pelo celular, a internet levava à mansão da filha de Heráclito, onde Temer se servia de risoto e vinho, as mesmas informações que a TV despejava sobre o tapete do Alvorada. O STF indeferiu um par de pedidos de liminares contra a ordem escolhida por Eduardo Cunha para que os deputados pronunciem seus votos no microfone.

No principal julgamento da noite, os ministros da Suprema Corte rejeitaram por 8 votos a 2 duas teses esgrimidas pelo advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo. Numa, ele alegava que a comissão do impeachment cerceou o direito de defesa de Dilma. Noutra, reclamava que o relator Jovair Arantes (PTB-GO) incluiu no seu relatório temas estranhos à denúncia original —Lava Jato e pedaladas praticadas antes do atual mandato presidencial, por exemplo.

Com esses dois argumentos, Cardozo pretendia anular a sessão que o presidente da Câmara marcou para domingo. Pedia que o STF determinasse o reinício do processo. Algo que daria tempo ao governo para tentar cooptar aliados que lhe permitam atingir a marca de 172 votos, mínimo necessário para brecar o impedimento da presidente.

O STF decidiu que, na hora de votar, os deputados terão de levar em conta apenas as duas acusações relacionadas ao atual mandato de Dilma: 1) a edição de decretos que autorizaram gastos sem a anuência do Legislativo. 2) empréstimos contraídos pelo governo em bancos oficiais as chamadas pedaladas fiscais.

Depois de circular de rodinha em rodinha, Temer acomodou-se numa das mesas. Dividiu-a com outras dez pessoas. Entre elas líderes de partidos engajados no impeachment. Nesse universo, as horas mais preciosas são as mais rápidas. Na contabilidade dos rivais de Dilma, já existem 363 votos a favor do impeachment, 21 além do mínimo necessário. Daí a incômoda sensação de que, para a oposição, certos dias, como os dois que faltam para o domingo da votação, têm 100 anos de duração.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.