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Josias de Souza

Aliados articulam pós-Temer e presidente resiste

Josias de Souza

06/07/2017 02h06

Intensificaram-se as conversas entre aliados do governo sobre a hipótese de substituição de Michel Temer pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia. Alheio aos sinais de fragilidade, Temer reuniu 26 ministros na noite desta quarta-feira (22 titulares e quatro interinos). Reiterou sua disposição de lutar pelo cargo. Distribuiu cópias da defesa entregue horas antes à Comissão de Constituição e Justiça da Câmara pelo advogado Antonio Cláudio Mariz. Pediu apoio e mobilização para assegurar os votos necessários à rejeição da denúncia que o acusa de corrupção. Tachou a acusação de inepta. E disse estar convicto de que prevalecerá sobre o procurador-geral da República Rodrigo Janot.

Temer viajará nesta quarta-feira para a reunião do G-20, na Alemanha. Às vésperas do embarque, acumularam-se ao seu redor os sinais de deterioração do apoio congressual do governo. Enquanto o Planalto cantava vitória, Rodrigo Maia dizia em privado que Temer ainda não dispõe de votos para barrar na Comissão de Justiça a denúncia da Procuradoria. Faltam-lhe inclusive os votos dos pseudoaliados do PSDB. Dos sete tucanos com assento na CCJ, apenas Paulo Abi-Ackel está propenso a salvar Temer.

O movimento da infantaria do tucanato na Câmara levou o presidente em exercício do PSDB, senador Tasso Jeressati, a elevar o tom. Um dia depois de Aécio Neves ter defendido o apoio a Temer em discurso no Senado, Tasso referiu-se à possibilidade de o tucanato finalmente desembarcar do governo como algo inevitável: "Não se pode brigar com os fatos. Certas coisas a gente não controla", disse ele ao comentar os humores do ninho. Mesmo no Senado, sete dos 11 integrantes da bancada tucana já torcem o bico para Temer.

Em conversa com o blog, o tucano Cássio Cunha Lima, vice-presidente do Senado, traduziu o drama vivido por Temer: "Impopular, o presidente está perdendo o seu grande trunfo, que é o apoio congressual. Escolheu-se para relatar a denúncia da Procuradoria na CCJ um deputado (Sérgio Zveiter) que é do PMDB e deve apresentar um parecer contrário aos interesses do presidente. Ou seja: Temer já não conta nem com o apoio integral do seu partido. Sua situação vai ficando insustentável."

Cunha Lima prosseguiu: "O principal capital político de Temer é a capacidade de cultivar um bom relacionamento com o Congresso. Mas o deputado Rodrigo Maia, que pode vir a ser o seu substituto, também desfruta de excelentes relações na Câmara. Na prática, instalou-se no Brasil uma espécie de parlamentarismo informal. E Temer está sob o risco de receber um voto de desconfiança do Parlamento." Na reunião com os ministros, Temer soou confiante. Mas declarou a certa altura que, se a Câmara autorizar a abertura do processo, o Supremo Tribunal Federal o absolverá da acusação de corrupção passiva.


Ironicamente, Temer sofre o mesmo processo de erosão que fez ruir o apoio de Dilma Rousseff no Congresso. Nesse enredo, Rodrigo Maia está para Temer assim como Temer estava para Dilma. Ou seja, o presidente da Câmara, "Botafogo" nas planilhas da Odebrecht, virou candidato natural ao trono. A exemplo da antecessora petista, Temer alimenta seus apoiadores à base de cargos e verbas. Entretanto, até os seus aliados mais fisiológicos começam a enxergar em Maia uma opção de poder que lhes garante o mesmo tipo de ração sem o desgaste de ter que grudar a imagem à figura radioativa de Temer, hoje um grande anti-cabo eleitoral. Partidos do chamado centrão perceberam que podem trocar de presidente sem mudar a estrutura do governo.

Com um pedido de reserva quanto à divulgação do seu nome, um deputado que costuma ser tratado no noticiário como membro do chamado "baixo clero" disse ao blog: "Eu gosto muito do Temer. Ele trata os deputados com um respeito que a Dilma não tinha. Mas preciso me reeleger no ano que vem. Será uma eleição dura. Não dá para carregar nas costas um presidente com 7% de popularidade. Se fosse para rejeitar uma denúncia, vá lá. Mas parece que haverá outras duas. É difícil absorver tanto desgaste perto da eleição." O autor desta avaliação integra os quadros do PR, um partido controlado pelo mensaleiro e ultrafisiológio Valdemar da Costa Neto, com quem Temer reuniu-se reservadamente há três dias.

Também no meio empresarial o apoio a Temer começa a migrar do estado sólido para o gasoso. Nas últimas 48 horas, o repórter conversou com um industrial de São Paulo e um dirigente de banco de investimentos. Ambos já incluíram a hipótese de queda de Temer no rol de suas previsões. Um deles disse que começa a enxergar em Rodrigo Maia um mal menor. Afirmou que o próprio presidente da Câmara sinaliza ao mercado a intenção de manter as reformas econômicas.

O outro empresário, anotou numa mensagem de WhatsApp: "A queda de Temer já está precificada pelo mercado. Se cair, não muda nada. Temer perdeu muito do apoio que tinha do empresariado, cansado, desiludido e que já está aceitando o Maia. A PEC do teto foi um tiro no pé. Se não passar qualquer coisa palatável na reforma da Previdência, só os gastos da própria Previdência ultrapassarão o limite de gastos da PEC, o que configuraria crime de responsabilidade."

Curiosamente, na reunião com os ministros, Temer voltou a se jactar dos avanços econômicos obtidos durante a sua gestão. Disse que enfrenta uma guerra pelo poder. Insinuou que seus detratores prejudicam o país. Não criticou apenas o procurador-geral Rodrigo Janot. Mimetizando o comportamento do PT, Temer bateu duramente na TV Globo. Para o presidente, a emissora faz campanha por sua queda. Na GloboNews, disse ele, a campanha dura "24 horas por dia." Temer esqueceu de lembrar (ou lembrou de esquecer) que é ele próprio o responsável pelo fornecimento da matéria-prima que empurrou sua Presidência do noticiário político para o policial.

Enquanto Temer se reunia por três horas com seus ministros, Lula participava da posse da senadora Gleisi Hoffmann na presidência do PT federal. Ao discursar, o pajé do PT também falou sobre Globo e sobre a crise que engolfa o mandato de Temer (assista abaixo).

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.