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Josias de Souza

Aliados de Temer querem votar a jato modificações nas regras da delação

Josias de Souza

15/07/2017 04h29

Além de tentar livrar Michel Temer da denúncia que o acusa de corrupção, os deputados leais ao governo terão uma prioridade extra ao retornar das férias, em agosto. Desejam apressar a aprovação de mudanças nas regras da delação premiada, esvaziando os poderes do Ministério Público e tornando mais difíceis os acordos. A articulação conta com o aval do Planalto.

Líder do governo Temer na Câmara, o deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) sustenta que o Legislativo precisa perder o medo de tratar do tema. Sob pena de se tornar um Poder irrelevante. Para ele, "o Poder Legislativo está acovardado, o Congresso Nacional não tem coragem de se impor." Por essa razão, "tem perdido o seu poder."

Ao defender na quinta-feira a rejeição da denúncia contra Temer na Comissão de Constituição e Justiça, Aguinaldo Ribeiro disse em público algo muito parecido com o lema segundo o qual é preciso "estancar a sangria", eternizado no áudio de um delator na voz do líder de Temer no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR).

"…Nós precisamos rediscutir essa legislação [sobre a colaboração premiada], que foi mal feita, mal produzida, que está sendo reinterpretada ao sabor dos interesses", disse Aguinaldo Ribeiro aos colegas. "Nós temos que ter coragem para enfrentar." (assista abaixo à intervenção do líder do governo, na sessão da Comissão de Constituição e Justiça.)

A intenção dos governistas é a de empurrar as novas regras sobre delação para dentro do Código de Processo Penal, cuja modificação está sendo debatida na Câmara. Presidente da comissão que trata da revisão do código, o deputado Danilo Forte (PSB-CE) já manifestou a intenção de endurecer as regras das delações. Fala em limitar também as conduções coercitivas de investigados. Mas nenhum parlamentar se animou, por ora, a subscrever os projetos.

O líder Aguinaldo Ribeiro parece enxergar no inferno astral vivido por Temer e Lula, um bom momento para a reação dos deputados. "É importante que nós possamos dar a resposta nesse instante. Sabe por quê? Porque isso vale para todos. Não é com alegria que nós vemos um ex-presidente da República sendo condenado. […] Nós não queremos isso para o país."

O deputado queixou-se dos colegas, que brigam uns com os outros. Acha que a hora é de união, não "desse tipo de relação, que parece uma relação apaixonada e doentia, em que uns aqui aos outros atacam." Disse que se a Câmara autorizar o Supremo Tribunal Federal a deliberar sobre a denúncia contra Temer, estará, na prática, "impedindo uma Presidência da República."

Aguinaldo Ribeiro é, ele próprio, alvo da Lava Jato. Integra um inquérito aberto em 2015 pelo Supremo Tribunal Federal a pedido do procurador-geral da República Rodrigo Janot. Nele, políticos do PP são acusados de formar uma organização criminosa para assaltar os cofres da Petrotras. O deputado alegar ser inocente.

Os governistas tramam a nova emboscada não por conta dos defeitos da delação premiada. Estão incomodados com a eficácia da ferramenta. Deve-se o sucesso de operações como a Lava Jato a três fatores: a corrupção passou a dar cadeia; o pavor despertado pelas prisões soltou a língua dos delatores; e as colaborações judiciais vitaminaram as investigações. Daí a pressa dos deputados em reagir.

Aguinaldo Ribeiro é exemplo acabado da mutação genética que pode acometer esse espécime chamado "governista". Ex-ministro das Cidades de Dilma Rousseff, ele votou contra o impeachment de madame na comissão especial que tratou do tema. Depois, ao farejar a debilidade política de Dilma e constatar que a maioria da bancada do seu partido votaria a favor da deposição, o ex-ministro aliou-se à lâmina da guilhotina.

O deputado repetiu o vaivém com Eduardo Cunha. Paparicou o amigo enquanto ele foi o todo-poderoso presidente da Câmara. E votou a favor da cassação do mandato de Cunha, jogando-o no colo do juiz Sergio Moro, em Curitiba. Quer dizer: Michel Temer talvez devesse colocar de molho as barbas que não possui.

 

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.