Marun: ‘Vamos investigar quem nos investigou’
Na certidão de nascimento, a mais recente comissão parlamentar de inquérito criada no Congresso recebeu o nome de CPI da JBS. Foi instalada há cinco dias. Nem começou a trabalhar e já merece um apelido: CPI da Desforra a Jato.
Ao farejar o cheiro de queimado, dois senadores pediram para sair: Ricardo Ferraço (PSDB-ES) e Otto Alencar (PSD-BA). "Estão saindo por medo", atacou o relator da CPI, deputado Carlos Marun (PMDB-MS), em entrevista ao Globo.
Ao justificar sua opinião, Marun arrancou, por assim dizer, o manto diáfano que encobre os reais objetivos da CPI: "Nós vamos investigar quem nos investigou. Vamos interrogar quem sempre nos interrogou. Esse é um paradigma que será quebrado."
Ex-comandante da milícia parlamentar de Eduardo Cunha, Marun tornou-se o cabeça da infantaria congressual de Michel Temer. Ferraço e Alencar bateram em retirada logo que o personagem foi alçado ao posto de relator da CPI.
Marun atribui a debandada não à sua reputação, mas à covardia dos senadores, que estariam com "medo desse embate que nós vamos ter." Medo de, "dali a pouco ter que se posicionar em relação a um procurador. E também, em alguns, pode acontecer a vontade de que a JBS não seja investigada."
O relator soou enfático nos seus ataques aos que deixam a CPI. "Essa saída é pirotécnica e, para mim, fruto do medo. Não renuncio de jeito nenhum. Esta CPI é uma CPI para corajosos. Eu tenho meus defeitos, mas não sou uma pessoa desleal."
Sem medo de exagerar na perda do recato, Marun insistiu: "Vejo, sinceramente, nesses que saem, falta de coragem para enfrentar uma situação dessa, de romper o paradigma, de investigar quem sempre nos investigou. Eu vejo aí o temor."
No papel, o principal propósito da CPI é investigar os financiamentos do BNDES para a casa de carnes dos irmãos Joesley e Wesley Batista. É como se os parlamentares forçassem a maçaneta de uma porta já arrombada pela Operação Bullish. Nela, a PF e a Procuradoria da República já cercaram os negócios da JBS com o banco.
Perguntou-se a Marun se o acordo de delação da JBS, revogado na semana passada, seria o alvo principal da CPI. E ele, sem titubeios: "Isso é o que provocou a CPI, para dizer a verdade —as circunstâncias controversas desse acordo."
Recém-incorporado ao grupo dos políticos que têm acesso às cozinhas do Planalto e do Jaburu, Marun defende Michel Temer atacando Rodrigo Janot, o procurador-geral que deixa o cargo depois de protocolar no Supremo Tribunal Federal a segunda denúncia contra o presidente —dessa vez por formação de organização criminosa e obstrução da Justiça.
"Não é que ele [Janot] seja um bandido, mas um vilão do crescimento do Brasil acho que ele é. O doutor Janot é hoje a pessoa que mais atrapalha o Brasil. Vilão do PMDB, não. O PMDB tem pessoas que têm contas a acertar. Que acertem."
O problema é que as pessoas do PMDB que têm contas a ajustar dispõem do escudo do foro privilegiado. Uma delas é o presidente da República. No caso de Temer, as contas só seriam cobradas se a Câmara concedesse autorização ao Supremo Tribunal Federal para investigar o inquilino do Planalto.
Entretanto, Temer foge da investigação como vampiro da luz do Sol. E a tropa liderada por Marun transforma o plenário da Câmara em cemitério para a desova de denúncias contra o presidente. É em meio a esse ambiente que a CPI da Desforra a Jato chega para "investigar quem nos investigou."
Noutos tempos, os parlamentares ainda tentavam disfarçar suas manobras. Hoje, fazem barulho em CPIs como se quisessem acordar Darwin no túmulo, para mostrar que sua teoria evolucionária estava correta. No Congresso brasileiro já é possível inclusive observar pessoas que trabalham pela involução do ser humano.
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